quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Mostra de Cinema São Paulo (O Médico Alemão-Wakolda)



O Médico Alemão (Wakolda)

Vem da Argentina, em coprodução com a França, Espanha e Noruega, o terceiro longa-metragem da cineasta Lucía Puenzo- selecionado pelo seu país para concorrer na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2014-,o thriller O Médico Alemão, assim batizado no Brasil e em outros países do título original Wakolda, que anteriormente realizou o cultuado XXY (2007) e O Menino Peixe (2009). É outro filme que foi bem recebido pelo público na 37ª. Mostra de Cinema de São Paulo, abordando um misterioso médico alemão que conhece por acaso uma família típica argentina na Patagônia, em 1960, seguindo-a até Bariloche em meio a uma tempestade violenta que desaba naquela região com seus mistérios de forte magnetismo.

No drama familiar XXY, a diretora retratava uma criança que nasceu com ambas as características sexuais e tentava fugir dos médicos que desejavam corrigir a ambiguidade genital num vilarejo do Uruguai. Agora o tema é novamente a relação de um profissional especializado em genética como centro da trama sobre Josef Mengele, conhecido como o “Anjo da Morte”, pelas suas atrocidades com seres humanos, inclusive para testar as resistências, coletando órgãos em seu laboratório para experiências futuras.

Puenzo foca essencialmente a estrutura montada em Bariloche para acobertar o nazista com a identidade falsa de Helmut (Alex Brendemuhl- o intérprete catalão está impecável) e os horrores cometidos pela obsessão da raça pura ariana prevalecendo sobre as demais. Ao se utilizar de testes em animais num grande laboratório montado com pesquisadores, camas, uma infraestrutura hospitalar e uma arquivista/fotógrafa da escola (Elena Roger) contratada para documentar todos os experimentos realizados, como se depreende de suas anotações sobre o monstro e seus quadros esquematizados com traços e observações.

A utilização das lindas bonecas em série, inspirada no feio brinquedo da menina de 12 anos Lilith (Florencia Brado- a pequena e graciosa atriz uruguaia esteve bem no papel), é uma metáfora da raça pregada por Hitler e sua insanidade contrária à permanência dos judeus no mundo, pregando o extermínio em massa, num universo escabroso que começa com a perseguição consentida da família. O casal Enzo e Eva (Diego Peretti e Natalia Oreiro) tem três filhos menores e em véspera do quarto e seguem todos num carro para o Lago Nahuel Huapi para abrir uma hospedaria, tendo como seu primeiro cliente o protagonista carismático, elegante, bom papo, conhecedor de métodos científicos eficazes para esticar a traumatizada pequena Lilith e a próxima criança preste a nascer.

Um filme que não alivia nem a mãe que concorda com as experiências, tanto da filha como dela mesma nesta fase de gestação, embora sem saber de quem se tratava realmente. Até o pai se submete aos encantos da oferta milionária em dinheiro para multiplicar as bonecas e ganhar dinheiro, sob a alegação de ser ele o autor da façanha, ao criar o embrião da descoberta, ou seja, a bruxinha da filha. É uma maquiavélica manobra diversionista que dá certo e a cineasta questiona: todo mundo teria seu preço? Parece que sim, e o nazismo foi em frente na Argentina, como se depreende das pífias investigações.

O Médico Alemão é um bom suspense, embora um tanto quanto previsível como se depreende do final já antecipada na cena do voo de um pequeno avião. A tempestade é uma clara premonição metafórica decorrente de um grande temporal com raios que desaba e soa como uma situação de grandes complicações para aquelas criaturas em fase de cair na arapuca, com acontecimentos nebulosos que estão por vir num cenário bucólico de uma espetacular nevasca.

Eis um filme que sugere uma grande teoria da conspiração, se não fosse os fatos reais narrados na história de um médico e suas práticas desprezíveis reveladas num clima de encurralamento de pessoas inocentes nesta amostragem de personagens sofridos. Há uma atmosfera equilibrada com um clímax adequado na película de Puenzo, ainda que esteja longe de empolgar, pelo menos deixa sua contribuição sobre um passado perigoso para a tranquilidade do povo argentino que sofreu com as bestiais incursões nazistas deflagradas.

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