sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Mostra de Cinema São Paulo (Para Aqueles em Perigo)

















Para Aqueles em Perigo

O Reino Unido também se faz presente na 37ª. Mostra de Cinema de São Paulo com o apreciável drama Para Aqueles em Perigo, sendo dirigido pelo estreante em longas Paul Wright, antes havia em sua filmografia quatro curtas-metragens. O enfoque tem como tema a culpa de um jovem aparentemente desajustado numa paradisíaca ilha isolada na Escócia, em que é o único sobrevivente de um estranho acidente de um barco pesqueiro em alto-mar, tendo morrido seu irmão mais velho Michael e outros quatro pescadores. Uma inesperada tragédia que torna uma ida sem volta daqueles jovens, causando muita comoção na população.

Um drama com algumas similitudes com o fabuloso filme sobre perda e culpa, o holandês em coprodução húngara Em Silêncio (2013), da cineasta estreante Ricky Rijneke. Uma comunidade que está voltada para o folclore, onde existe como fato indiscutível a superstição de um monstro no fundo do mar. Todos sabem ou ouviram falar dele e a tradição é espalhada com o propósito de atormentar o acusado sobrevivente Aaron (George MacKay) pela inconsequência. O rapaz é visto como um exilado e sem papel definido no meio social entre os moradores, é escorraçado como um cachorro sarnento e enxotado de um lado para outro, como se vê na cena do pai rancoroso de uma das vítimas, ou na ameaça de morte do ex-sogro do irmão (Michael Smiley).

No filme Em Silêncio havia o tormento da irmã mais velha no papel da mãe e seu sentimento de culpa, com o esquecimento involuntário do trágico acidente ocorrido de automóvel, bem como a frustração de tristeza com a perda e o sonho não realizado; já em Para Aqueles em Perigo é o irmão mais novo que carrega esta carga emocional em relação ao mano vitimado com quem não tinha uma boa relação, disputava o mesmo espaço e se sentia humilhado e inferiorizado, tendo na figura carismática da mãe (Kate Dickie) entrando como o algodão entre os cristais. Sua interferência é oportuna e defende com sutileza seu filho desprezado pela sociedade hostil. Conta a lenda do fundo do mar para o filho, que pede para repetir numa cena que determinará o caminho a ser seguido pelo Aaron.

Diante do evidente questionamento pela autoria das mortes anunciadas e recusando-se a acreditar que realmente houve os fatos, o rapaz vai à procura do irmão com o intuito de trazê-lo de volta ao convívio dos vivos. Há uma sutil mescla de delírio pela crença mística com uma loucura sintomática pela perda da lucidez que corrói e esmaga sua consciência dentro de uma atmosfera de dor e revolta com misto de raiva e ódio, deixando margem para interpretação favorável dos seus detratores, diante dos sonhos delirantes que vêm perseguindo-o nas noites de pesadelo.

Há uma significativa mexida no roteiro que coloca ainda mais dúvidas sobre a realidade sobre os acontecimentos trágicos ocorridos, quando há o ingresso de Jane (Nichoa Burley), a namorada apaixonada de Michel que se aproxima de Aaron e cria um clima de fingimento de affaire, o que haverá desdobramentos e margens para mais dúvidas ainda, após algumas revelações.

A abordagem sobre os fantasmas da perda pela suposta culpa se entrelaçam no bom começo da história, apesar do longa se desenvolver com boa desenvoltura, porém o clímax vai esvaindo-se e o final inusitado apaga um pouco o brilho e tira a sustentação de uma obra com forma e efeito para reflexão mais apurada, diante da falta de coesão num roteiro dúbio e fraquejante. Há fatos desarmonizados com o contexto que se encaixam numa construção psicológica do protagonista para a simplificação esquizofrênica.

Eis um drama que falta um aprofundamento maior de causas e efeitos, visto aqui como lineares e carecedores de um mergulho no imaginário da comunidade de pescadores humildes colocados como algozes, diante da falta de um elemento de reflexão mais aproximado com a tragédia ali existente e sua densidade. Para Aqueles em Perigo é um filme razoável com uma boa proposta, mas que poderia alcançar um resultado melhor se fosse dirigido por um cineasta mais atento com o contexto e as revelações culturais localizadas.

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