Centro Histórico
O longa-metragem coletivo Centro Histórico foi realizado para celebrar a capital da cultura
em Portugal, no norte do país, a bela cidade de Guimarães, com direção de
Manoel de Oliveira, Aki Kaurismaki, Pedro Costa e Victor Erice, dividem em
quatro curtas um outro sucesso garantido na 37ª. Mostra de Cinema de São Paulo.
Muitos relatos para serem contados por estes cineastas engajados com a arte no reduto
português com suas peculiaridades locais do cotidiano para ser divulgado sem
cerimônia e causar uma bela reflexão sobre a história com emoção e
autenticidade.
Num painel de relatos estão dois curtas primorosos e outros
dois bem aquém do aguardado. O primeiro e o terceiro são os melhores da produção
coletiva, sendo que Kaurismaki faz uma abordagem interessante e muito crítica em O
Tasqueiro , com
a perda da clientela e como se vê numa das ruas de Guimarães. Há uma profunda
desilusão amorosa e os fracassos se sucedem talvez por falta de imaginação do
taberneiro para tentar manter seu espaço aberto, enfocados com o triste fado como
sonoplastia e dando uma boa e correta dramaticidade no curta silencioso com uma
linguagem em tom ficcional adequado.
O segundo ato tem Costa como responsável por O Lamento da Vida Jovem, possivelmente o
mais fraco de todos, beirando a sonolência coletiva entre os espectadores,
diante do estilo de filmar sem imaginação e exaustivo pela repetição da
massificante cena do elevador fechado, através do delírio de um escravo sobre a
revolução de Cabo Verde nos anos 70 e o soldado imaginário num diálogo risível.
Arrasta-se e não engrena, perde-se uma boa chance de ser dado um recado
eficiente e direto.
O terceiro curta Vidros
Partidos vem com a assinatura de Erice, disparado o melhor de todos, em tom
documental ao melhor estilo de Eduardo Coutinho de As Canções (2011) e Edifício
Master (2002), com um painel de relatos contados pela boca de personagens que
viveram uma situação no passado, são pessoas humildes que tiveram muitas
dificuldades pelos obstáculos do dia a dia, sendo que destes há de tudo um
pouco, numa galeria de depoimentos consistentes e emocionantes sob o ponto de
vista humano e com força de um pensamento positivo de esperança para alguns e
outros já desesperançados, com mágoas, tristezas e decepções.
É uma bela e comovente história sobre uma fábrica de tecidos
fundada no século 19 que faliu em 2002, onde os operários mostram seus dedos
cortados, com rostos cansados e olhos perdidos no tempo que passou. O epílogo do
curta é comovedor com o gaiteiro tocando e a enorme foto da mesa com as pessoas
tomando sopa num dia qualquer. Os rostos fotografados são aproximados
lentamente em closes magníficos, sobressaindo-se os olhares reveladores com um
impressionismo arrebatador de funcionários que criaram ilusões, outros tiveram
frustrações e alguns falam sobre a imigração para a França e o retorno sempre
aguardado. Um significativo mosaico pela riqueza do cotidiano de uma empresa
que serviu para muitas vidas sobreviverem, causando desalento em outras, mas
tudo com muito humanismo e a pergunta sobre qual o tempo foi melhor; passado ou
presente? Para o ator carismático há uma rede on-line e a perda do emprego se
deve muito ao avanço desenfreado da internet que teria retirado muitas vagas,
uma das grandes responsáveis pela crise do desemprego.
O centenário Manoel Oliveira encerra com o curta Conquistador Conquistado, mas decepciona
na abordagem crítica sobre os turistas e suas máquinas fotográficas, pelos usos
abusivos e desproporcionais, dando pouca importância para os museus e
monumentos, entre eles uma estátua e seu olhar de desaprovação. É um típico
documentário simplista do genial cineasta, porém desta vez pouco inspirado.
Centro
Histórico é um razoável filme coletivo, com uma linda fotografia primorosa,
diante de alguns méritos inegáveis como os curtas de Aki Kaurismaki e Victor
Erice, em suas abordagens certeiras sobre um Portugal mergulhado numa imensa
crise financeira decorrente da situação instável na Europa. Ao mesmo tempo
presta um belo tributo à capital da cultura Guimarães, relembrando um passado
difícil e um presente de incertezas maiores ainda sobre os tempos que não
voltam mais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário