quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Mostra de Cinema São Paulo (Independência)

















Independência

Vem das Filipinas o provável melhor filme da 33ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, com a obra-prima Independência, de impecável direção de Raya Martin, que também é o autor do roteiro. Com apenas 25 anos de idade, já arrebatou o prêmio de melhor filme no Festival de Pesaro de 2006, com o longa Or The Prolonged Sorrow of the Filipinos, tendo dirigido ainda Autohystoria (2007) e Now Showing (2008), todo inéditos no Brasil.

É uma obra extremamente madura e tem na simplicidade seu ponto alto e essencial para a beleza e a aula de cinema deste jovem filipino recém-formado em 2005, no seu País, já desponta como um dos mais promissores cineastas deste início de século. Será difícil a Mostra não contemplar Independência como sua apresentação maior, embora haja outra duas obras fortes na concorrência, como Abraços Partidos (Pedro Almodóvar) e o polêmico e extraordinário iraniano O Apedrejamento de Soraya M (Cyrus Nowrasteh)

Uma mãe foge com seu único filho para o meio da floresta, às vésperas de uma invasão dos EUA nas Filipinas. Seu medo da guerra é a causa da evasão e sua reclusão no interior de uma selva indevassável. Vivem em circunstâncias precárias para um ser humano, sem as mínimas condições de dignidade dentro de uma choupana construída com pedaços de paus e capim como telhado. Logo seu filho encontra uma moça caída entre as árvores com ferimentos leves, sendo abrigada, vindo a formar um casal com um o nascimento de um menino. Mesmo com toda a simploriedade do casebre, criam algumas galinhas e o agora jovem pai caça e pesca para a sobrevivência.

O drama é latente e o temor dos invasores está em cada galho que se mexe naquele local atemorizante e escuro com frequentes chuvas intermináveis, com seus segredos escondidos em seu interior. O farfalhar das folhas chega a ser alucinante, com o barulho incessante pelo canto das aves e sente-se até o rugido dos animais selvagens, embora não explícito, somente para o espectador mais atento e sensitivo. O psicológico é testado com os enervantes ruídos das folhas, galhos e aves com as tempestades que jorram águas abundantes naquele cenário fantástico. A tensão instalada a cada momento ou dúvida sugere o ataque iminente dos americanos com bombas e morteiros que poderiam explodir naquele local inóspito. Todo aquele aguaceiro com trovoadas, que se assemelham com os roncos dos motores dos aviões, invadindo seus cômodos, ou melhor, seu chão que serve de cama

A floresta funciona como uma metáfora entre caça e caçador, entre os soldados yanques perseguindo suas presas filipinas, num país em que a democracia é inexistente e a morte de uma criança por furtar frutas serve como exemplo para os demais. Não há julgamentos mas um recado direto para aquele povo sofrido e humilde. Não importa a fome ou a luta pela sobrevivência, pois até o javali na selva teve mais sorte, tendo o direito de fugir do caçador.

A morte alastra-se na família, dizima quase todos, assim como a guerra liquida o povo filipino exaurido pela pobreza e seus direitos subtraídos, há o remanescente que sobrevive e está literalmente acuado, quase sem saída. Sua corrida desesperadora dos seus perseguidores invocam novamente o elemento da caça e do caçador como simbologia de vidas perseguidas pelos ditadores em seus regimes totalitários. Resta o inferno traduzido por parte de um céu avermelhado contrastando com as cores do paraíso que esperam para a redenção, com um final memorável numa cena antológica.

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