Muros Inseguros
Vem da Argentina em coprodução com outros quatro países o
suspense experimental Bem Perto de Buenos
Aires (Historia del Miedo, no original), com direção do jovem estreante Benjamín
Naishtat, filme que se fez presente no Festival de Berlim de 2014. A fotografia é primorosa,
o enquadramento reflete o domínio de câmera pelo neófito cineasta de apenas 28
anos. Já no prólogo mostra-se um helicóptero da polícia sobrevoando uma área
vizinha na periferia de Buenos Aires de um condomínio horizontal luxuoso, dando
o aviso de desocupação aos invasores. Logo se percebe a intenção e o foco da
trama, em retratar a luta de classes e a estratificação social, através da
captação das imagens na sequência das cenas.
Há vários personagens que transitam, entram e saem sem muitas
explicações na trama. O protagonista Pola (Jonathan Da Rosa) é um jovem de
poucas palavras e de pouca expressão. Ele mora nas proximidades, trabalha
no subúrbio, tem na namoradinha Tati (Tatiana Giménez) o elo com os
moradores dali. A aparição de um buraco na cerca que protege a propriedade
deixa todos os habitantes em
pânico. O longa retrata o isolamento daquele lugar, na qual
sua população fica aos poucos desconfiada e atônita. Cria-se um painel de medo
e tensão, deixando claro que poderão ser atacados, num clima de ansiedade e um
terror pelo desconhecido, através de um sentimento de êxtase que beira ao
primitivismo.
O diretor admite inspiração no soberbo O Pântano (2001), da compatriota Lucrecia Martel, mas na realidade
sua realização deriva mais como um genérico do badalado O Som ao Redor (2012), de Kleber Mendonça Filho, ao abordar classes
sociais diferentes, personagens de lados opostos da cerca da pobreza. Ou seja:
de um lado a doméstica e seu sobrinho, de outro a arquiteta empregadora e a
namorada do rapaz que trabalha na residência dos amigos da ricaça. A história é
um mosaico de situações paralelas que se interligam por alguma circunstância.
Naishtat faz uma radiografia de uma cidade dividida pela desigualdade econômica,
porém fica no meio do caminho por não aprofundar-se, sobra a pretensão como
objetivo, deixando como resultado um registro confuso pelo roteiro
inconsistente e sem rumo, embora houvesse muito mais para ser extraído.
Bem Perto de Buenos
Aires é uma obra que não chega a afundar, pois deixa bons ensinamentos e
propostas válidas como a metáfora do blackout no condomínio durante um jantar
de pessoas vazias e distraídas, que sequer sabem o destino dos filhos que
brincam jogando bombinhas na rua, numa alusão ao desconhecido invisível que
poderia estar rondando suas casas, numa visão caolha de um imaginário criado
pela aversão ao vizinho empobrecido, redundando em medo e pânico. O silêncio
quebrado pela simulação do jogo da verdade no jantar é mais um elemento de
hipocrisia contida e o desprezo com a classe menos favorecida, na qual foi
magistralmente captado pelo estreante carioca Fellipe Barbosa, no drama
brasileiro Casa Grande (2014) que retrata
sem demagogia os contrastes pela visão social da sociedade representada por uma
classe média alta que tenta manter valores superados. Já Mendonça Filho mostra fundamentalmente
um filme silencioso que capta os barulhos externos, além dos símbolos de uma
brutal realidade de belos lugares com moradias bem protegidas.
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