A Iminência do Fim
Mais uma boa e deliciosa produção no Festival Varilux de Cinema Francês, desta vez com um hábil viés
gastronômico, faz uma abordagem suculenta, mas com um molho amargo na agridoce
comédia intimista Sobre Amigos, Amor e
Vinhos, dirigido por Éric Lavaine, que estreou em longas com Poltergay (2006), reaparece com Incognito (2008), realiza seu terceiro
longa Protéger et Servir (2010) e
dirige seu quarto filme Bem-Vindo a Bordo
(2011).
Uma trama com boa desenvoltura, para um roteiro simples e
inteligente nas sutis tiradas cômicas, com uma espetacular fotografia de
imagens num cenário deslumbrante. Neste clima de cuidar da saúde com corridas, exercícios,
não fumar, comer alimentos saudáveis e trabalhar muito, que Antoine Chevalier
(Lambert Wilson- seguro e correto, atuou em
Vocês Ainda Não
Viram Nada (2012), de Alain Resnais e Homens
e Deuses (2010), de Xavier Beauvois), sofre um ataque cardíaco no dia em
que comemora com amigos seu aniversário de 50 anos. Logo cai a ficha e se dá
conta que passou a maior parte dos últimos anos tomando cuidados para manter
uma excelente aparência, mas nada adiantou como medida preventiva, foi fisgado
por uma fatalidade do destino.
O diretor conduz com leveza o enredo, colocando o
protagonista como um homem que fazia tudo como manda o figurino, mas ao se
decepcionar com os imprevisto da natureza, revê sua condição humana de mortal
e decide adotar um novo estilo de vida. Deixou para trás aquela imagem de quem sempre
zelou por tudo, preocupado com a família, evitava magoar os amigos e concordar com as
tolices ditas, para ser agradável, mas violentando sua personalidade quase reprimida.
Conclui que fazer isto sem levar uma vida aprazível não o protegeu, então por
que não desfrutar dos prazeres que a vida oferece para tentar ser feliz? Paradoxalmente o infarto lhe fez bem, pois mudou e com ele
foi a reboque seus parceiros de mais de 10 anos que se conheceram na faculdade,
exceto o mecânico de alcance menor e ideias curtas, mas bem recebido por todos
pela espontaneidade.
A comédia é tipicamente francesa, com apetitosa gastronomia,
vinhos de boa qualidade e um champagne de alto nível das melhores uvas, dando
sensações e prazeres pelos olfatos, táteis e visuais. O grupo de amigos marca
férias para um local adorável numa casa de campo entre vales e montanhas. Os
conflitos brotam e a convivência deixa o protagonista irritado com Yves
(Guillaume de Tonquédec), um chato vegetariano com mania de mapas e
localizações, piadas sem graça e uma esposa fútil. Pergunta a Jean-Michel
(Jérôme Commandeur): o que ele faz ali, se todos são casais? Vai destilando sua
ironia e falando o que pensa. Sobra até para esposa, uma médica que se faz de
tonta e vai levando a situação entre fingir e trair. Baptiste (Franck Dubosc) e
Olivia (Florence Foresti), formam um casal em crise matrimonial, dando um tempo
para a relação conflitada, mas ele torna-se obsessivo por não desgrudar da ex,
uma mulher extrovertida e fanática por futebol, mas que tem um passado com um
deles, que vem à tona e causa um certo constrangimento. Tem ainda o amigo
introvertido, que não se abre com ninguém sobre seus problemas financeiros,
diante do quadro instável do setor imobiliário
O enredo da comédia de Lavaine não está voltado diretamente
para uma história em relação aos regozijos dos vinhos, como em Sideways- Entre Umas
e Outras (2004), de
Alexander Payne, ao narrar a história de dois amigos pelas fazendas
vinícolas da Califórnia como despedida de solteiro de um deles para o vinho
servir como forma de refúgio de todos os problemas: separação, trabalho, mulher
e amor; já em Um Bom Ano (2006), de Ridley Scott, o
protagonista é obrigado a voltar para França, onde foi educado na arte da
elaboração para classificar as uvas por um tio, dono de um vinhedo no país, por
conta de seu falecimento.
Um filme sobre a idade que vai passando e a proximidade da terceira
idade como iminência do fim, o tom é suave como proposta no desenrolar da
trama, mas o tema traz à baila momentos de uma reflexão e uma reavaliação sobre
a vida, os modos comportamentais, as mudanças de hábitos e as consequências que
poderão advir e as frustrações colocadas em xeque. Sobre Amigos ,
Amor e Vinhos não é uma realização superior, mas agrada pela elegância simples da
empatia dos personagens com a plateia, bem como pela maneira como é focada as
difíceis relações humanas, principalmente tentar ser agradável com todos, pode
soar falso, e até estourar como uma bolha inflada. Uma boa comédia para ser
degustada, curtida como Antoine encarou a nova fase de sua vida, sem se prender
a um compromisso maior, pois ela refoge do politicamente correto, o que é um indício
alentador.
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