domingo, 29 de outubro de 2017

Mostra de Cinema São Paulo (Uma Questão Pessoal)


Uma Questão Pessoal

Veio da Itália direto para a 41ª. Mostra de Cinema de São Paulo, em coprodução com a França, o razoável drama de guerra civil no verão de 1943, em Piemonte, no território italiano, Uma Questão Pessoal, com uma fotografia simplesmente espetacular de Simone Zampagni. A direção e o roteiro são dos irmãos Paolo e Vittorio Taviani, em mais um longa-metragem da vasta filmografia da dupla. Eles deram início em suas carreiras com uma série de documentários e, entre seus filmes de ficção, os mais famosos são: Pai Patrão (1977) que ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes daquele ano; A Noite de São Lourenzo (1982); Bom Dia, Babilônia (1987, 11ª Mostra); A Casa das Cotovias (2007); e César Deve Morrer (2012), vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim. A 30ª Mostra exibiu alguns de seus importantes filmes políticos, tais como: O Prado (1979), Os Subversivos (1967) e Sob o Signo do Escorpião (1969).

O último filme dos realizadores, César Deve Morrer, ambientou a peça teatral Júlio César, de William Shakespeare, que foi levada ao cinema pelos irmãos octogenários Paolo e Vittorio, à época com 81 e 83 anos respectivamente, para ser encenada por um grupo de presidiários selecionados pelo teatrólogo Fábio Cavalli, também responsável pela montagem de A Divina Comédia Humana, de Dante. O local escolhido para o cenário foi a prisão de segurança máxima Rebibbia, em Roma. Fizeram com muito fôlego um comovente e maravilhoso registro documental ao ficcionar o enredo trágico numa adaptação magistral para as telonas escuras, sendo vencedores do Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2012. Cinco anos depois, parece que a fonte da inspiração secou, a disposição embora esteja vigorosa e repleta de energia decepciona pela redundância, beirando a tolice novelesca da clássica disputa de uma linda mulher por dois amigos inseparáveis, como se fossem irmãos. Nada de novo, tudo velho e já contado inúmeras vezes por diversos diretores. Uns com mais inteligência e senso criativo, outros caindo na mesmice de sempre e sem alternativas para inovar, no que se enquadra os Taviani.

Uma Questão Pessoal é um retrato pouco inspirado e bem convencional de uma guerra civil na Itália, nos anos de 1940, entre os fascistas (denominados de vermes) contra a resistência (chamados de partisanos), estes contrários à política de Benito Mussolini, o líder máximo (O Dulce) durante o período de 1922 a 1943- quando foi preso por tropas aliadas durante a Segunda Guerra Mundial- foi o grande criador do movimento fascista, que deu origem ao Partido Nacional Fascista, no fim da década de 1910, sendo o primeiro ideólogo totalitário a chegar ao poder máximo de uma nação da Europa Ocidental. A aspiração ao controle total do Estado na vida dos cidadãos acabou inspirando outros líderes políticos da época, entre eles Francisco Franco, na Espanha e Adolf Hitler, na Alemanha. Porém, é bom ressaltar, que esta história também já teve dezenas de versões cinematográficas e teatrais.

O drama aborda o protagonista Milton (Luca Marinelli) que é apaixonado pela bela Fulvia (Valentina Bellè), uma moça que brinca com seus sentimentos num jogo arriscado e perigoso, pois gosta mesmo é de receber as cartas dele e flerta com pequenas armadilhas sentimentais do coração do sofrido rapaz com seu intenso amor e sempre com os pensamentos voltados para a musa de sua razão de viver. O tempo passa e um ano depois, Milton acaba aderindo à Resistência italiana durante a Segunda Guerra Mundial. Mas durante este período de imprecisão do romance, a obsessão lhe atormenta pelas dúvidas, logo acaba por descobrir que a sua amada está perdidamente apaixonada por seu melhor amigo, Giorgio (Lorenzo Richelmy), que também é membro do mesmo movimento em que lutam para depor o Dulce. Toma uma decisão difícil na sua trajetória, resolve ir atrás do grande amigo na bucólica e esplendorosa região de Langhe. O inesperado se sucede e Giorgio acaba de ser preso pelos grupos fascistas. O amigo tenta de toda as maneiras realizar uma troca de presos, mas suas tentativas são infrutíferas, sendo que em uma das raras chances ocorridas, o preso fascista era um maluco que simulava tocar bateria, mas sem prestígio para uma negociação, sendo que suas pretensões heroicas se encaminham para a frustração. E assim a trama se desenvolve com um certo marasmo rumo ao desfecho de pouca lucidez.

Há uma pífia reflexão sobre os efeitos da guerra civil e a truculência dos soldados e revolucionários em Uma Questão Pessoal, narrada pelo ponto de vista do protagonista partidário da missão assumida junto aos partisanos. Os jovens resistentes, entre os quais o personagem central e o secundário, atuam com pouca amplitude nas cenas contrastantes do cenário recriado pela elogiável reconstituição de época do figurino e da bonita trilha sonora, em especial, a encantadora canção do clássico infantil O Mágico de Oz (1939), de Victor Fleming e King Vidor, quando brilhou Judy Garland. Um filme que acompanha os sonhos ludibriados, a decepção, o sofrimento de um e a prisão de outro. A esperança que se esvai em um contexto de guerra entre compatriotas nas adversas causas que levaram para o confronto e o desencanto de uma geração que deu a vida nos campos ensanguentados da guerra sem limites, alimentados pelos déspotas de plantão, de forma brutal, tudo em nome do poder tirânico daquele período nebuloso, que é revisto nesta sofrível obra pouco inspirada e fragmentada pelo tédio da redundância criada sem grande esmero na temática.

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