sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

As Aventuras de Pi



















Luta pela Sobrevivência

Vem do polêmico escritor canadense Yann Martel a adaptação para o cinema de seu controvertido romance homônimo As Aventuras de Pi, acusado de plagiar o livro Max e os Felinos do imortal acadêmico gaúcho Moacyr Scliar, falecido em 2011, esteve em debate dez anos antes de ser filmado. Não houve uma convincente negativa e ainda lançou uma espécie de agradecimento no prefácio, quase como um pedido de desculpas e alegou ter sentido muito pelo ocorrido.

Ang Lee é um diretor taiwanês radicado nos EUA, mostra-se versátil em seus longas por ser muito dinâmico e criativo. Começou sua carreira com A Arte de Viver (1992) e Banquete de Casamento (1993), passou por Razão e Sensibilidade (1995) e O Tigre e o Dragão (2000), polemizou em O Segredo de Brokeback Mountain (2005) e agora atenuou com uma simplicidade exagerada e previsível em As Aventuras de Pi, embora tenha obtido onze indicações para o Oscar deste ano. Nesta sua nova incursão cinematográfica a trama retrata a história de um menino pobre e dedicado aos animais, filho do dono de um zoológico na Índia que sobrevive a um naufrágio, quando a família toda está indo embora para o Canadá, na busca de dias melhores e novos horizontes. Fica 227 dias à deriva no Oceano Pacífico, após o navio afundar por decorrência de uma enorme tempestade em alto-mar, servindo-lhe a lição de moral do pai sobre a relação entre humanos e animais ferozes como muito importante para sua sobrevivência.

O filme mostra o medo como sendo a dúvida de uma ameaça constante de um tigre-de-bengala batizado ironicamente de Richard Parker ao único sobrevivente. Uma luta da razão contra a irracionalidade, mesclada por doses de razoável suspense nesta fábula moderna adulta que instiga o espectador e o faz ficar atento às manobras instintivas do garoto nesta viagem fantasiosa com seu arquirrival irracional. Surgem de todos os lados algumas alucinações decorrentes da situação inusitada como supostos delírios daquela criatura com seu destino entrelaçado com o animal, tendo na água seu elemento motivador de vida.

É uma fábula com a constante luta desesperada para continuar vivendo, onde não deixa de existir velhos clichês, como do manuseamento de manuais que indicam o caminho da vitória heroica, beirando a ensaios de autoajuda. É contado na primeira pessoa pelo protagonista já adulto para um escritor interessado em publicar a história do naufrágio, tendo dúvidas em qual versão das duas seria a autêntica. Lee busca na alegoria uma saída honrosa, ao invocar a hiena, o macaco, a zebra e o tigre sob a lona do bote e adicionar com personagens humanos de carne e osso como a mãe, o pai, o cozinheiro mau, e o protagonista.

Os efeitos especiais são bem elaborados, embora haja um esvaziamento cansativo na trajetória, como milhares de peixes voando sobre aquele feroz tigre realizado por computação gráfica. Há pouca verossimilhança num realismo forçado nas cenas de confronto no oceano dentro da embarcação e seus acessórios que criaram a balsa improvisada como uma rota de fuga. A montagem é enfraquecida por um filme longo demais para uma historia carecedora de maior abrangência no contexto e dividida por versões inconsistentes, tornando-se tedioso numa abordagem pouca imaginativa e de aprofundamento tênue, principalmente nos diálogos vazios de Pi e o escritor.

Não é um grande filme, embora as reflexões levem para uma frágil constatação de uma civilização desejada, como o fim da era de uma família estruturada aparentemente na Índia e um futuro buscado no Ocidente com revelações contidas de um passado, como na alusão às despedidas que inexistiram e deixaram marcas. É uma aventura com um resultado bem menor e aquém do aguardado na filmografia de Lee, mas que não invalida no todo a obra, embora haja um destaque especial para a fotografia primorosa dentro de um contexto raso numa estrutura narrativa simples sobre os desafios da sobrevivência e teorias pragmáticas da fé com a natureza.

2 comentários:

CRISTINA ANDRÉIA BORBA FIGUEIRÓ disse...

Um humano e um tigre. Um precisa do outro para sobreviver a um naufrágio em As Aventuras de Pi. Mais: todos nós entramos em um bote em alto mar junto com o menino Pi e o tigre Richard Parker, no filme de Ang Lee, para entender o significado da vida, provar a existência de Deus,contrapor a parte selvagem que sai debaixo da lona e luta com a parte humanizada, até ser controlada e adestrada, para depois votar para as profundezas no inconsciente. Um simbolismo fantástico. Tudo para sobreviver. O reflexo é outro ponto abordado no filme através do confronto de Pi e o tigre - no bote, na ilha, no olhar dos dois para as profundezas do oceano, no encontro do céu com o mar no horizonte, e na expectativa de Pi no momento da despedida do tigre. Quanto à versão verdadeira da história? A primeira. A explicação é que o filme trata acima de tudo de afirmar que Deus existe, e isso só pode ser provado pelo protagonista através da tragédia pessoal que viveu. Pi perdeu tudo e único vínculo que restou com suas origens foi o tigre, por isso ele precisava tanto dele para sobreviver. O tigre não o devorou porque também sentiu que Pi era o seu apoio não só porque o alimentava, mas porque o ligava à vida. Sobraram só os dois em alto mar. Isso confirmaria a existência de alma no tigre? Pode ser. E toda a narrativa, e tudo que vimos confirma que Deus existe? Que Ele se manifesta quando pensamos que tudo está perdido? O filme mostra que sim. Pi só traz a segunda versão, em um minuto, porque queria livrar-se dos japoneses que insistiam em negar a existência de Deus que para ele já não era uma dúvida mas um fato. Ele viveu a experiência. A sua busca nas três religiões havia sido confirmada na sobrevivência inédita: a convivência com um tigre em um bote em alto mar.

Roni Figueiró disse...

Parabéns pela tua crítica construtiva e abordagem sobre o filme.

Te aprofundaste e pegaste muito bem o lado de Deus e sua existência entre os homens e o significado da vida e sobrevivência.