segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

















O Sim da Redemocratização

O Chile apresenta seu representante que concorrerá à vaga de melhor filme estrangeiro do Oscar deste ano. No tem direção de Pablo Larraín, em seu quarto longa-metragem e com retumbante aceitação da crítica e de público na abertura com pompa da 36ª Mostra de Cinema de São Paulo, também foi exibido na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes e ganhou o Prêmio CICAE- Confederação Internacional dos Cinemas de Arte-. Realizou antes os longas Fuga (2006), o aclamado Tony Manero (2008) com boa repercussão na 32ª Mostra de São Paulo e a terceira realização foi Post Mortem (2010).

A trama gira em torno da pressão internacional sobre o ditador chileno Augusto Pinochet, que convoca um plebiscito para avaliar seu governo sanguinário e a manutenção em 1988. Os líderes da oposição convencem o jovem publicitário visionário e equidistante René Saavedra (Gael Garcia Bernal- em grande performance e convincente no papel) a encabeçar a campanha do não à continuidade e sim para as eleições diretas em todos os níveis. Muito semelhante ao apelo popular no Brasil entre 1983 e 1984, com o célebre movimento que mobilizou o país em torno da redemocratização “Diretas Já”.

O drama mostra que há poucos recursos financeiros para o publicitário, que ainda sofre uma ostensiva ameaça permanente dos guardas do ditador. Mas nem tudo está perdido e a equipe monta um plano audacioso e criativo de marketing para libertar o país da opressão, através de uma vitória eleitoral, apesar das condições minguadas que se apresentam no contexto antidemocrático. Vive-se num governo que reprime com extrema violência os grupos opositores e os manifestantes ao regime.

A grande sacada do filme é mostrar o bom humor na luta pela pacificação democrática de todos os chilenos. Inicia com o jingle de aparente sucesso, uma opção publicitária de fácil memorização para ser levado à televisão nos restritos quinze minutos da oposição, o que irá alavancar com uma boa base na tentativa de conquistar mais adeptos contrários ao sistema implantado em conluio com os EUA. A frase simbólica e logo cantarolada por todos é “Chile, a alegria está chegando”, com derivações e forte influência em “We are the World”, uma canção composta por Michael Jackson e Lionel Richie, gravada em janeiro de 1985 por 45 dos maiores nomes da música norte-americana, no projeto conhecido como USA for África, tendo por objetivo arrecadar fundos para o combate à fome no continente africano.

Larraín se autocita no seu longa, no início da construção do projeto da campanha pelo não. O arco-íris vira a simbologia e representa as diversas matizes de cores dos vários partidos e facções, embora sofresse rejeição por ser associado às cores da luta gay, não foi considerada por Saavedra, que tocou em frente sua ideia do marketing pelo não, mesmo que o empresariado engajado ameaçasse retirar apoio financeiro. Um dos méritos do diretor é saber explorar os anseios da população sem excessos, como na cena construída com perspicácia sobre os apoiadores do regime, onde a empregada doméstica que se diz satisfeita com a situação, pois seu filho trabalha e a filha estuda, e ao ser questionada sobre as torturas e os desaparecimentos de pessoas, manifesta-se que isto é coisa do passado.

No é um filme instigante sem ser fabuloso, com cenas marcantes pelo envelhecimento de cores com distorções de imagens esmaecidas e desfocadas para dar um realismo da época, filmadas em vídeos que eram muito usados na década de 70 pelos canais de TV, num arrojo de muita técnica do cineasta. Foi baseado na peça El Plebiscito, do escritor Antonio Skármeta- o mesmo de Ardente Paciência que inspirou o filme O Carteiro e o Poeta (1996)-, marcado pelo começo da derrocada da ditadura de Pinochet instalada no Chile, em 1973.

É uma boa abordagem com dignidade do ocaso de uma era estigmatizada pela barbárie de fuzilamentos, após sessões de torturas e o triste índice de milhares de desaparecidos. Mas depois da amargura reina a bonança de um povo embevecido pelas ruas de Santiago, num banho de alegria e êxtase pela redemocratização de um Chile próspero, onde o epílogo deste drama com tom documental mostra o crescimento após o latente ódio visceral oriundo da repressão. É um marco de otimismo, a contrário sensu dos filmes Desaparecido (1982), de Costa-Gavras, A Casa dos Espíritos (1993, de Bille August e Machuca (2004), de Andrés Wood, bem mais abrangentes na linha de denúncias, sendo sombrios e melancólicos, mas que não contrapõem a expectativa de Larraín e seu entusiasmo contido e enriquecedor.

Nenhum comentário: