terça-feira, 18 de maio de 2010

Utopia e Barbárie














Retrospectiva como Documentário

Silvio Tendler já fez algo bem melhor que este insosso Utopia e Barbárie, num misto de documentário com retrospectiva de televisão, com uma colagem de fatos e acontecimentos do início do século passado até nossos dias atuais. É um diretor bem aceito pelas esquerdas e odiado pela direita, tendo em vista seus filmes sempre voltados para personagens controvertidos e visto como comunista, como no caso de Jango (1984), um notável documentário que retrata todas as fases de um presidente da República apeado do poder pelos militares, instalando-se no Brasil a terrível ditadura de 1964, que até hoje tem suas feridas abertas e é questionada a própria Lei de Anistia. Anteriormente realizou Os Anos JK- Uma Trajetória Política (1980), que lhe rendeu bons prêmios e alguns dividendos; assim como abordou a vida de Carlos Marighella em documentário contestado pela ala direitista deste país. Também foi realizador de filmes sobre os personagens famosos como Oswaldo Cruz e Josué de Castro.

Numa espécie de revisão com retrospectiva dos tempos, Tendler traz à tona as mazelas políticas e econômicas desde a 2a. Guerra Mundial. Fala da possibilidade iminente do risco de desaparecimento dos sonhos que embalavam a juventude de sua época e de outras, através destes eventos sócio-políticos-econômicos. No bojo das entrevistas com intelectuais, políticos notórios, artistas de cinema, diretores de teatro, jornalistas conceituados, há uma clara ideia de explicar o porquê das injustiças. Embora fique uma sensação de panfleto, é inevitável deixar de reconhecer que os povos dissociados de seus governantes têm como concepção a justiça, a igualdade e a fraternidade, apesar de escaparem pela desarmonia mundial, frustrando as pretensões e fantasias daqueles que sonham com um mundo dito melhor, não fica demonstrado no documentário a coerência eficaz e plausível.

Apesar do discurso fácil da igualdade de raças, cor, credo, algo parece soar como artificial e as cenas que vão se acumulando sem uma necessária cronologia deixam uma reflexão panfletária num roteiro rápido e acelerado, parecendo ter pressa em acomodar os diversos discursos de uma retórica emblemática de retrospectos sem grandes ilusões; passando pela bomba atômica jogada pelos EUA no Japão, guerras, Diretas Já, eleições de Collor e Lula.

Utopia e Barbárie tem uma cara de manifesto sindical misturado com propaganda eleitoral, com um proselitismo ultrapassado e arcaico, numa visão caolha e desproporcional aos trabalhos já realizados pelo bom documentarista que é Sílvio Tendler, mas que desta vez errou a mão, pois tinha tudo para dar certo. Havia temas como as ditaduras na América Latina, as constantes invasões dos EUA, os movimentos de contracultura, a Guerra do Vietnã, as independências das colônias africanas e asiáticas; porém tudo abordado de forma simplória e sem profundidade, que resultaram num trabalho pífio e de pouca ou nenhuma repercussão.

Não se discute o tom ideológico, mas a forma de colagem como retrospectiva dos tempos, sem se deter e aprofundar, ficando a clara sensação de uma geleia geral ou uma salada desconexa de uma maturidade que poderia ser melhor elaborada, caso houvesse um bom senso e uma preocupação mínima com o resultado e o seu público alvo. Porém, se a pretensão era realizar um documentário para ser exibido num canal de televisão, como aqueles de final de ano, o conceito do filme já não é tão degradante e morno, nem haverá uma crítica tão contundente com relação à linguagem cinematográfica.

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