sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A Dama de Ferro



Cinebiografia Chapa-Branca

A diretora Phyllida Lloyd tem em seu currículo apenas um longa-metragem, o execrável Mamma Mia (2008), que coincidentemente Meryl Streep também atuou. Agora em sua segunda realização, esta cinebiografia da ex-primeira-ministra da Inglaterra Margaret Thatcher é calcada de forma oficialista, visando ressaltar mais as virtudes e esquecer ou abordar de maneira superficial os defeitos da durona líder inglesa, neste insosso, comprometedor e desestruturado A Dama de Ferro, denominação esta alcunhada pelos governantes da extinta União Soviética no auge da Guerra Fria.

O filme gira de um manifesto político vazio, de abordagem rasa, em defesa da ex-premiê para um melodrama de sua doença aplacada pela senilidade até os sinais evidentes do Mal de Alzheimer, estruturado em flasbacks de sua vida desde jovem, da serelepe e juvenil Thatcher (Alexandra Roach), sendo que na fase adulta até a velhice assume definitivamente Meryl Streep, que simplesmente arrasa no papel da mais poderosa mulher do mundo, a grande liderança inflexível que faltava para o Partido Conservador da Grã-Bretanha. Até é válida a brincadeira de que a atriz está mais parecida com a própria Thatcher, do que ela mesma.

Há discretas cenas de referência à Guerra das Malvinas, num embate violento contra a Argentina, onde menciona que os oponentes estão tomados por “uma gangue de fascistas”, talvez a melhor frase do filme, pois logo aos ditadores foram nocauteados do país vizinho. Sua posição foi forte como sempre, determinando que houvesse o confronto de guerra e que fosse afundado um navio dos argentinos que criava um certo temor aos ingleses. Outra boa sacada do filme, foi quando um representante dos EUA tentava dissuadi-la do embate, recebeu como resposta que a tomada do Havaí pelos norte-americanos não foi pacífica.

A cinebiografia aborda a doença superficialmente, longe do estupendo O Filho da Noiva (2001), de Juan José Campanella, na inesquecível atuação de Ricardo Darín, esta sim, uma abordagem profunda e humana, nos relatos sensíveis e dignificantes. Mas Thatcher não chega a ser vista como uma vítima da doença, pois a diretora tentar mostrar ser ela uma mulher forte e arredia aos diagnósticos dos médicos, sempre acompanhada do fantasma do marido morto, seu fiel escudeiro Denis (Harry Loyd no passado e Jim Broadbent no presente). É contraditório porque há momentos em que ele reclama de sua presença constante na política, em outras está sempre ao seu lado e tudo está muito bem, obrigado. Um contrassenso total, embora acompanhe desde a juventude até sua transição para o cenário político. Outra lacuna marcante é a ausência de abordagem dos filhos na fase adulta, aparecendo esporadicamente em lembranças passageiras.

Lloyd mostra com todas as tintas que Thatcher é uma mulher forte, chegando ao cargo máximo e obtendo índices de aprovação estrondosos, atingindo o topo e sendo mencionada pelos colegas partidários como a sucessora de Winston Churchill e que poderá receber todas as honras de Estado. Evidentemente que o filme é uma apologia simplista, estruturado num roteiro debilitado, simplista, com intuitos de veneração e primando pelo mau gosto do roteirista Abi Morman. É picotado a torto e a direito na montagem, enfocando raros momentos da trajetória propriamente dita da ex-primeira-ministra, como dos sindicatos dos mineiros de carvão, visto com desprezo pela diretora, numa caracterização explícita de uma obra chapa-branca, desconstituída de um mínimo de profundidade e crítica social.

A humanização de um personagem célebre tem suas cobranças. O excesso pode glamourizar ou destruir de vez pelos estereótipos da personagem retratada. A cineasta conseguiu liquidar pelos dois motivos, tanto é que nem na Inglaterra o filme foi bem recebido, diante da banalização esvaziada da figura emblemática de Thatcher, numa desastrada e caricaturada amostragem da ex-poderosa, que tomou conta do noticiário político internacional de 1979 a 1990. A Dama de Ferro é uma baboseira chata e desprezível, salvando-se tão somente a excelente equipe de maquiagem e a monumental atuação de Meryl Streep.

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