terça-feira, 30 de julho de 2013

O Que se Move



As Mães

Precedido do prêmio de melhor atriz para Fernanda Vianna no Festival de Gramado do ano passado, embora tenha recebido uma calorosa ovação na apresentação, o primeiro longa-metragem de diretor paulista Caetano Gotardo O Que se Move merecia melhor sorte. É bem superior ao vencedor do kikito de melhor filme Colegas (2012), de Marcelo Galvão. Aliás, o magnífico O Som ao Redor (2012), de Kleber Mendonça Filho, foi outro injustiçado na competição, ao levar apenas a melhor direção, em detrimento da simpática comédia escrachada premiada injustamente.

Gotardo é também o responsável pelo roteiro, buscando inspiração em notícias da crônica policial de jornais, sem ser documental, encontra no cotidiano seus subsídios para elaborar e brindar os aficionados da sétima arte, com este fabuloso drama familiar. Tem como apoio a experiente produção de Filmes do Caixote, onde Juliana Rojas e Marco Dutra, diretores de Trabalhar Cansa (2011), assinam respectivamente a correta montagem e a fascinante música da película, retratando com seriedade um olhar feminino sobre os filhos perdidos por tragédias do dia a dia, através da visão perspicaz de três mães sofridas em que o destino lhe aplicam surpresas desagradáveis. Elas emocionam com o amor materno dedicado aos seus filhos, sob uma narrativa brilhante. Não há lugar para pieguismo ou apelações emocionais desproporcionais, porém faz com que o espectador se identifique com uma das histórias, ou ao menos saiba de um acontecimento próximo.

A trama das três famílias tem como fio condutor a figura materna e sua dor, ao retratar histórias de núcleos familiares. São contadas num formato de três episódios distintos e sem conexão, dramas pessoais com choros e alguns risos sombrios, distantes de uma alegria avassaladora, onde o amor é o tema principal. A abordagem é realizada com simplicidade, muita sensibilidade e esmerada sutileza de um cineasta promissor e voltado para o que acontece na imprensa sem grande repercussão. A humanidade é enfocada com uma discreta melancolia em cenas marcantes que levam para uma reflexão mais profunda sobre o que acontece diariamente com pessoas comuns e quase sem voz de reivindicação.

As imagens se fundem com as palavras mencionadas em formato poético sobre a desgraça e o luto da professora (Cida Moreira) prestes a se aposentar, dedicada ao filho e preocupada com suas viagens pela internet até altas horas da madrugada e que se vê surpreendida por policiais em busca de computadores na sua residência, diante de denúncias de incursões a sites de pedofilia. A reação surpreendente do filho e o canto de dor e amargura tocam fundo a alma, coração e mentes dos espectadores. Noutro episódio, o pai que esquece a criança no banco de trás do carro, por ter alterado a rotina de seu trabalho e seu encontro com a mãe (Andréa Marquee) é uma ode à culpa e a sensação de perda do sentido da vida. Já o terceiro caso é baseado num fato real acontecido em 2002, mais conhecido como Pedrinho de Goiânia, diante do fato do roubo de um bebê da maternidade e somente aos 16 anos encontra seus pais biológicos. Nesta altura da vida, já havia constituído e se estruturado numa nova família, recebendo afeto, carinho e dedicação daqueles que o criaram. O reencontro de mãe (Fernanda Vianna), pai e filho mostram o vazio que jamais será preenchido ou suprido de alguma forma.

Um cinema de autor que centraliza na figura materna a essência da trama, num relato epidérmico e comovente dos danos nas mães. Elas cantam e veem no movimento das pessoas alguma saída para suas fatalidades, que talvez pudessem ser evitadas pelas circunstâncias. Três contos tristes, mas de certa maneira está contido de uma beleza e de uma força feminina arrebatadora, através da alta densidade dramática pela autenticidade que emprestam para o desenrolar do enredo. Os sentimentos são mostrados também pelo olhar e com imagens sensoriais reveladoras e que calam fundo no imaginário humano.

O Que se Move é um drama equilibrado, com a tensão e o suspense em planos longos e logo cortados por contraplanos suaves, dando leveza na proposta, sem se importar com diálogos prolixos ou estéreis. Os sentimentos são captados e a proposta vai ao encontro da plateia com harmonia e deixa marcas perturbadoras com lucidez. Há elementos psicológicos bem caracterizadores e envolventes que registram com rara qualidade.

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