Precedido do prêmio de melhor atriz
para Fernanda Vianna no Festival de Gramado do ano passado, embora tenha
recebido uma calorosa ovação na apresentação, o primeiro longa-metragem de
diretor paulista Caetano Gotardo O Que se
Move merecia melhor sorte. É bem superior ao vencedor do kikito de melhor
filme Colegas (2012), de Marcelo
Galvão. Aliás, o magnífico O Som ao Redor
(2012), de Kleber Mendonça Filho, foi outro injustiçado na competição, ao levar
apenas a melhor direção, em detrimento da simpática comédia escrachada premiada
injustamente.
Gotardo é também o responsável
pelo roteiro, buscando inspiração em notícias da crônica policial de jornais,
sem ser documental, encontra no cotidiano seus subsídios para elaborar e
brindar os aficionados da sétima arte, com este fabuloso drama familiar. Tem
como apoio a experiente produção de Filmes do Caixote, onde Juliana Rojas e
Marco Dutra, diretores de Trabalhar Cansa
(2011), assinam respectivamente a correta montagem e a fascinante música da
película, retratando com seriedade um olhar feminino sobre os filhos perdidos
por tragédias do dia a dia, através da visão perspicaz de três mães sofridas em
que o destino lhe aplicam surpresas desagradáveis. Elas emocionam com o amor materno
dedicado aos seus filhos, sob uma narrativa brilhante. Não há lugar para
pieguismo ou apelações emocionais desproporcionais, porém faz com que o
espectador se identifique com uma das histórias, ou ao menos saiba de um
acontecimento próximo.
A trama das três famílias tem como fio condutor a figura
materna e sua dor, ao retratar histórias de núcleos familiares. São contadas
num formato de três episódios distintos e sem conexão, dramas pessoais com
choros e alguns risos sombrios, distantes de uma alegria avassaladora, onde o
amor é o tema principal. A abordagem é realizada com simplicidade, muita sensibilidade
e esmerada sutileza de um cineasta promissor e voltado para o que acontece na
imprensa sem grande repercussão. A humanidade é enfocada com uma discreta
melancolia em cenas marcantes que levam para uma reflexão mais profunda sobre o
que acontece diariamente com pessoas comuns e quase sem voz de reivindicação.
As imagens se fundem com as palavras mencionadas em formato
poético sobre a desgraça e o luto da professora (Cida Moreira) prestes a se
aposentar, dedicada ao filho e preocupada com suas viagens pela internet até
altas horas da madrugada e que se vê surpreendida por policiais em busca de
computadores na sua residência, diante de denúncias de incursões a sites de
pedofilia. A reação surpreendente do filho e o canto de dor e amargura tocam
fundo a alma, coração e mentes dos espectadores. Noutro episódio, o pai que
esquece a criança no banco de trás do carro, por ter alterado a rotina de seu
trabalho e seu encontro com a mãe (Andréa Marquee) é uma ode à culpa e a
sensação de perda do sentido da vida. Já o terceiro caso é baseado num fato
real acontecido em 2002, mais conhecido como Pedrinho de Goiânia, diante do
fato do roubo de um bebê da maternidade e somente aos 16 anos encontra seus
pais biológicos. Nesta altura da vida, já havia constituído e se estruturado
numa nova família, recebendo afeto, carinho e dedicação daqueles que o criaram.
O reencontro de mãe (Fernanda Vianna), pai e filho mostram o vazio que jamais
será preenchido ou suprido de alguma forma.
Um cinema de autor que centraliza na figura materna a
essência da trama, num relato epidérmico e comovente dos danos nas mães. Elas
cantam e veem no movimento das pessoas alguma saída para suas fatalidades, que
talvez pudessem ser evitadas pelas circunstâncias. Três contos tristes, mas de
certa maneira está contido de uma beleza e de uma força feminina arrebatadora,
através da alta densidade dramática pela autenticidade que emprestam para o
desenrolar do enredo. Os sentimentos são mostrados também pelo olhar e com
imagens sensoriais reveladoras e que calam fundo no imaginário humano.
O Que se Move é um
drama equilibrado, com a tensão e o suspense em planos longos e logo cortados
por contraplanos suaves, dando leveza na proposta, sem se importar com diálogos
prolixos ou estéreis. Os sentimentos são captados e a proposta vai ao encontro
da plateia com harmonia e deixa marcas perturbadoras com lucidez. Há elementos psicológicos
bem caracterizadores e envolventes que registram com rara qualidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário