Solidão na Boleia
Las Acácias é mais
um filme intimista vindo do Prata com tema da solidão e subtema o desemprego,
muito bem dirigido pelo neófito Pablo Giorgelli. Foi destaque no 1º. Festival
de Cinema Argentino realizado em Porto Alegre. Participou
da 35ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, ano de 2011, e ganhou o
Prêmio Câmera de Ouro de 2011, uma distinção do Festival de Cannes ao melhor
longa-metragem de um diretor estreante. Abocanhou o prêmio de melhor roteiro no
29º. Festival de Havana e ainda o de melhor filme e montagem na 60º. Edição de
Cóndor de Prata.
Em outras produções, este tema tão recorrente e universal da
solidão também esteve presente, como nos longas A Velha dos Fundos (2010), de Pablo José Meza; no instigante A Chuva (2008), de Paula Hernández; em O
Homem ao Lado
(2009), de Mariano Cohn e Gastón Duprat, numa reflexão magistral da privacidade
e das relações em sociedade de duas famílias envolvidas pela complexidade dos
seres humanos; na comovente comédia romântica contemporânea Medianeras (2011), de Gustavo Taretto, com
uma temática sobre os solitários em Buenos Aires na era do amor virtual; no
fascinante Encontros e Desencontros
(2003), de Sofia Coppola, retratando dois personagens sozinhos o tempo todo,
sofrendo com o fuso horário em Tóquio; mas nada se compara com o inesquecível episódio
Shaking Tokio, dentro do longa Tóquio (2008), dirigido
pelo coreano Bong Joon-ho, num dos mais melancólicos e devastadores
relatos de isolamento humano no cinema.
A trama tem no caminhoneiro Rubén (Germán da Silva- de
atuação irrepreensível e convincente) que transporta toras de madeira acácia do
Paraguai para a Argentina. Numa das constantes viagens, há um pedido expresso
do dono da carga para dar carona à filha de sua empregada, Jacinta (Hebe
Duarte) é uma mãe com a uma filha de 5 meses, de pai desconhecido, em busca de emprego
na Capital dos portenhos e ficará hospedada na casa de uma prima.
Giorgelli segura firme o drama que se desenvolve quase todo
dentro da boleia de um caminhão. O trajeto é longo e as durezas da viagem
começam a incomodar o motorista, deixando-o claramente irritado, diante das
pequenas paradas do veículo para que a mãe troque a criança e lhe dê de mamar,
pelos simbólicos pedidos através de choros compulsivos. Porém, aos poucos o
gelo vai se quebrando com os olhares cativantes da menininha servindo de elo
para dobrar a sisudez daquele homem rude e durão, sempre fumando e bebendo água
mineral, vez por outra sorve um mate, econômico nas palavras, de gestos discretos,
logo começa a sentir uma afeição quase que paternal pela criança e uma atração
reprimida pela mulher. Nunca arrisca muito e com o passar do tempo pelas
estradas poeirentas e rodovias asfaltadas, as relações parecem ficar mais
difíceis e angustiantes para quem transporta madeira e enxerga naquelas
criaturas ao seu lado como se fossem dois objetos de uma carga pesada, no
sentido metafórico.
Um filme com elenco consistente, de personagens construídos
com um vigor sólido invejável num roteiro enxuto e sem grandes pirotecnias,
prevalecendo a eficiência na direção que busca nos closes passar os sentimentos
doloridos e angustiantes dos protagonistas, sem exagerar nas tomadas de planos.
Não há trilha sonora, pois é substituída pelo ronco do motor e pelas trocas de
marchas, num filme seco e sem grandes requintes ou paparicos do diretor, onde
as expressões faciais são fortes e falam mais que os diálogos escassos.
Ao contrário do desastrado longa nacional À Beira do Caminho (2011), de Breno
Silveira, que buscou um sentimentalismo barato e melodramático voltado para um
resultado mais comercial. Já o cineasta argentino foge das armadilhas e da
previsibilidade com muita elegância e alguma sutileza ao deixar em aberto o
epílogo, mostra não só a reflexão da longínqua trajetória, como a busca pelo
carinho dentro de pequenos gestos, onde a solidão de um homem em sua cabine de
caminhão como uma casa rodando pelo asfalto, embora torne o personagem
grosseiro, mas também deixa irradiar o lado humanista e a carência afetiva de
uma alma à deriva.
Las Acácias é uma
película road movie sem muitos
diálogos, prevalecendo o silêncio sintomático dos desesperançados à
procura de um foco iminente de objetivo de vida. É lançado um olhar fraternal
pela universalidade das situações dos indivíduos solitários, num contraponto entre
o caminhão com a intimidade de seus personagens individuais, dentro dos
movimentos e dificuldades coletivas. Há rara interação entre estas pessoas
atônitas de uma instigante relevância social que ficam à mercê de um convívio melhor
neste sensível e belo drama que alcança um resultado plenamente satisfatório
pelo seu encantamento emocional com o espectador, diante do instigante tema da
solidão e como acessório o desemprego.
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