segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

The Post: A Guerra Secreta


Imprensa Livre

Considerado pela crítica como uma realização paradigmática para o estudo das teorias do jornalismo contemporâneo e ganhador de quatro Oscar, o sempre lembrado, por ser bem retratado é o clássico do gênero Todos Os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula. O cenário é o ano de 1972, no qual um repórter do jornal The Washington Post farejou algo ali de gravidade e iniciou uma investigação sobre a invasão de cinco homens na sede do Partido Democrata, que dá origem ao escândalo Watergate e que teve como consequência a queda do presidente Richard Nixon. Recentemente, o diretor Tom McCarthy se baseou em fatos reais ocorridos no ano de 2002, em Boston, cidade do Estado de Massachusetts, no Leste dos Estados Unidos, com Spotlight- Segredos Revelados (2015), vencedor de melhor filme e roteiro original do Oscar de 2016, para contar uma intrincada história do bom jornalismo sobre um tema de preocupação do Papa Francisco nos cerrados gabinetes do Vaticano: os relatos cada vez maiores da pedofilia incrustada na Igreja Católica. Abordava um grupo de jornalistas do famoso jornal The Boston Globe que mergulharam numa parafernália de documentos sobre diversos casos de abuso de crianças por padres, que se confirmaram pelos depoimentos.

Agora chegou a vez do festejado cineasta Steven Spielberg, nesta primorosa realização The Post: A Guerra Secreta, prestar uma calorosa e merecida homenagem ao jornalismo isento e imparcial como virtudes inerentes de uma mídia livre e descompromissada com o poder, exatamente num momento em que alguns meios de comunicação pouco confiáveis sofrem duras críticas pela divulgação na internet de “fake news” (falsas notícias). O roteiro de Liz Hannah e Josh Singer tem um formato linear, através de uma narrativa que tem uma estrutura em ritmo acelerado, abdicando dos recursos de pirotecnia ou sensacionalismo barato. Embora haja algum romantismo na profissão focada da imprensa investigativa, mostra os tempos das redações com máquinas de escrever e uma nuvem de fumaça de cigarros, obviamente sem o uso de celulares e computadores por ser retratado em 1971. Conta os bastidores da uma verdadeira batalha para ser publicado pelo jornal The Washington Post os famosos “Papéis do Pentágono” sobre um relatório que revelou as mentiras escancaradas da participação dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã para enganar a opinião pública, que depois levaria para o rumoroso caso do Watergate. Prende o público pelo desempenho sóbrio de um elenco coeso e uma adequada trilha sonora assinada pelo veterano John Williams.

O enredo do drama aborda Katharine Graham (Meryl Streep- de ótima atuação) como a proprietária viúva do célebre jornal local, que está envolvido justamente no lançamento de suas ações na Bolsa de Valores para ter liquidez de receitas ao se capitalizar e, consequentemente, ganhar um bom fôlego financeiro. Como um dos expoentes do jornalismo independente e imparcial centraliza na figura de Ben Bradlee (Tom Hanks- convincente no papel), o implacável editor-chefe do jornal, sempre atento por alguma notícia de repercussão que possa alavancar o periódico para subir de patamar no sempre concorrido mercado jornalístico. Quando o maior concorrente The New York Times dá início a uma série de publicações de matérias que denunciam vários governos norte-americanos, desde Eisenhower até Nixon, que deliberadamente mentiram acerca da posição do EUA na Guerra do Vietnã, com base em documentos sigilosos que vazam do Pentágono, o presidente Richard Nixon decide processar o jornal com base na Lei de Espionagem, para que nada mais seja divulgado. Um juiz de primeira instância concede a proibição, o que acarretará na mudança de rumo da fatídica documentação que parará nas mãos de Bradlee e sua competente equipe. Porém, terão que dissuadir a dona do jornal que é amiga de pessoas poderosas do governo envolvidas nas falcatruas que causarão escândalos. São questionados os possíveis favorecimentos de políticos próximos quando alguma coisa negativa lhes acontece neste mundo da realidade. O departamento jurídico teme o fechamento do jornal, inclusive com a prisão da proprietária e os responsáveis pela publicação. Trava-se um duelo sobre a importância da publicação da notícia para defender a liberdade de imprensa, ficar ao lado do público, e manter a ética e o profissionalismo dos jornalistas destemidos que querem correr o risco.

Os desdobramentos e as decisões nas batalhas com os tribunais superiores, inclusive a Suprema Corte, são um achado magnífico no belo drama de Spielberg. Ele coloca o espectador no interior da redação e o interliga com a correria das ruas pelos profissionais para apurar e descobrir os fatos novos, os entraves da burocracia no judiciário para julgar os limites da Lei de Espionagem sobre os documentos sigilosos, tidos como de segurança máxima da nação enxovalhada pelas reportagens que vasculharam os porões e gabinetes reservados a poucos, embora bem fechados, causando danos irreversíveis nos governos e desmascarando suas mentiras agasalhadas pelo manto protetor de um pseudopatriotismo. Dentro de uma atmosfera recheada de polêmica e dúvida, eis uma apropriada maneira de questionar e refletir sobre a complexidade do jornalismo investigativo responsável com nuances indicativas de combate ao atual governo de Donald Trump. Como é feito pelos erros e acertos, a motivação para justificar uma denúncia forte e perigosa, os riscos inerentes dos jornalistas envolvidos que poderão sofrer o furo da matéria pela concorrência, além do hermetismo hipócrita de um poder conservador e pouco comprometido com a verdade dos fatos noticiados. The Post: A Guerra Secreta é uma significativa obra de dignidade com a virtude da denúncia verdadeira que retrata com pujança a força de uma imprensa séria e corajosa, embora suscetível a pressões, com o cuidado dos princípios da boa, correta e fiel informação de credibilidade para tirar o véu dos segredos e suas falsidades ideológicas.

2 comentários:

Marcelo Tchelos disse...

Muito boa critica, amigo, também achei um filme primoroso, agradeço as dicas que deu. Abs!

Roni Figueiró disse...

Um forte concorrente ao Oscar. Gostei muito do filme. Continues me prestigiando com as leituras de minhas críticas.