quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

A Grande Aposta


Estouro da Bolha

Eleito pela Associação dos Produtores de Hollywood como o melhor filme de 2015, além de cinco indicações ao Oscar, entre as quais filme e direção, A Grande Aposta é uma narrativa linear da história de investidores financeiros que tiraram vantagem do colapso da economia mundial de 2008, que levou à bancarrota bancos, instituições financeiras e diversos empreendimentos imobiliários nos Estados Unidos e na Europa. O diretor Alan McKay atenua as falas repetitivas da linguagem em economês de títulos como CDOs, CDs, Swaps e Sup-primes, com explicações didáticas de especialistas daquele universo restrito de profissionais treinados e com conhecimentos que tornam a trama com ingredientes palatáveis razoáveis para os leigos da matéria. Para ser melhor compreensível segura o que pode a tecnicidades do jargão dos economistas.

Adaptado do livro de não-ficção A Jogada do Século, do jornalista Michael Lewis, publicado em 2010, aborda a trajetória do personagem Michael Burry (Chistian Bale), o excêntrico homem dos números em profusão, dono de uma empresa de médio porte, que decide investir muito dinheiro do fundo que coordena ao apostar que o sistema imobiliário quebrará logo. Previu com antecedência o desastre da crise econômica internacional provocada pela falência das hipotecas no ano de 2005. É tachado de louco pelos colegas investidores, tendo em vista que nunca ninguém havia apostado contra o sistema e obtido alguma vantagem. Ao saber da alegada bravata, o irrequieto corretor e narrador no filme, Jared Vennett (Ryan Gosling), percebe a oportunidade de ganhar muito dinheiro, passa a oferecer aos seus clientes os títulos teoricamente encalhados. Um deles é Mark Baum (Steve Carell), dono de uma corretora que enfrenta problemas pessoais desde que seu irmão se suicidou.

O cineasta faz o contraponto no enredo, ao colocar sorrateiramente dois neófitos na Bolsa de Valores que também querem auferir vantagens bilionárias apostando na desgraça alheia. Para isto, pedem ajuda a um consciente ex-executivo de banco de Wall Street, Ben Rickert (Brad Pitt), que vive recluso e afastado, por ora, das falcatruas, mas que enxerga uma maneira de abocanhar fortuna no alto risco das bolsas no sistema econômico que não tem o devido rigor da fiscalização pelos departamentos estatais. O famoso Wall Street Journal lava as mãos e deixa de investigar as maracutaias evidentes oriundas de fraudes escandalosas, diante da pífia alegação de uma cínica reputação. A bolha imobiliária está para explodir, através de um sistema viciado, na qual a má-fé impera em nome da cobiça exacerbada. Ninguém faz nada, embora haja fatos evidentes para a iminente quebradeira que fará com que muitas pessoas percam suas residências e empregos.

A Grande Aposta traça um painel sério sobre a farsa, em que a economia global é uma grande e neurastênica piada de fundo de quintal. Evidente que a culpa acabou recaindo como sempre nos coitados dos imigrantes que queriam ter vida digna e morar numa boa casa. Poucos dos fraudadores foram condenados e presos, a maioria se safou da prisão. A temática segue na esteira do bom longa-metragem O Lobo de Wall Street (2013), de Martin Scorsese, que conta a autobiografia de um canastrão e sedutor jovem aspirante a corretor da bolsa de Nova Iorque, ao faturar bilhões de dólares em golpes financeiros e constrói um império pelas especulações com trapaças e articulações fantásticas nos anos 1980 e 1990, num cenário de iates e lindas mulheres, tudo regado com champanhes e iguarias nas festas e encontros que se tornavam um transe beirando à Sodoma e Gomorra. Scorsese faz a crítica ao materialismo do homem ganancioso e sem limites pelo descontrole abissal. McKay faz um resumo de uma dolorosa história de cumplicidade maquiavélica da avidez especulativa, embora sem a contundência de Costa-Gavras em O Capital (2012), nem o feroz ataque ao capitalismo de David Cronenberg em Cosmópolis (2012), através daquele passeio pelas ruas pelo esquisito personagem acima dos mortais, trancafiado dentro de sua limusine blindada, uma espécie de bunker.

Os crimes do colarinho banco são enfocados de forma farsesca, pouca punição e roubalheira escancarada. A ambição é a mola propulsora da penúria financeira fulminante das bolsas de Wall Street propiciada pelos nefastos investidores que infestam aquele mercado, orbitando como urubus sem ética pela carne que lhes serão servidas como banquetes. Eis uma moldura movediça da canalhice e seus excessos verborrágicos para atingir os novos e futuros compradores no mercado de capitais que são demonstrados despudoradamente, sem se deixar levar pelo conservadorismo, o que é um ponto positivo. Um anticlímax num ambiente de surrealismo através de um ritmo narrativo dentro de uma atmosfera sóbria, coberto por sentimentos de desdouros. Mesmo que o diretor tente, pouco inova nos seus personagens no universo da safadeza dentro da ilegalidade, deixando seus heróis ou anti-heróis soltos e por vezes tornam-se conhecidos, dando mostras da sensação de estar diante do déjà vu nos padrões de Hollywood. Está longe de uma obra completa e eloquente, mesmo que se considere como provocadora, tem consistência na construção e desenvoltura do enredo para diálogos frios mesclados com doses contidas de humor neste interessante longa-metragem de reflexão sobre os efeitos nefastos da bolsa de valores na economia.

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