Uma Diva Reverenciada
Um filme sobre a vida da bela e talentosa Ingrid Bergman,
uma das mais premiadas atrizes da história do cinema, três vezes vencedora e outras
oito indicações ao Oscar. Eu Sou Ingrid
Bergman é dirigido pelo conterrâneo sueco Stig Björkman, que tem em sua
filmografia Imagens do Playground
(2009) e Mas o Cinema é Minha Amante
(2010). Realizado
como documentário intimista obteve um resultado além da expectativa, numa
narrativa sensível, poética e reveladora que passeia pela conturbada trajetória
da personagem-título, através de fatos verídicos que marcaram sua existência
entre prós e contras, alegrias e dissabores, mas sem aquele ranço viciado de
simplesmente contar uma história recheada de futilidades. Lança um olhar breve
de lembranças do passado, sem deixar de mostrar seus últimos dias já enferma do
câncer, mas querendo atuar e relembrar os episódios marcantes de sua carreira,
como na cena do depoimento orgulhoso do único filho homem.
O realizador utiliza materiais pessoais como diários íntimos
da biografada, cartas enviadas às suas amigas e vídeos amadores. Traça com
isenção todo o percurso pessoal e profissional da célebre atriz, incluindo seus
diversos casamentos, entre eles com o cineasta Roberto Rossellini, quando se
ofereceu para trabalhar com ele resultando numa grande paixão e três filhos,
sendo a mais famosa Isabela Rossellini. A relação fria e controvertida com os
filhos, o escândalo de adultério do primeiro marido, logo que veio de Estocolmo
para os Estados Unidos a convite de David O. Selznik para fazer carreira em Hollywood. Suas
andanças pela França, Inglaterra e Itália, num relato sobre os principais
filmes como Intermezzo: Uma História de
Amor (1939), Casablanca (1942), À Meia Luz (1944) -que rendeu o primeiro
Oscar-, Quando Fala O Coração (1946)
e Joana D’Arc (1948). Ficou afastada
por muitos anos, retornou à indústria cinematográfica americana e abocanhou
outra estatueta com Anastácia, A Princesa
Esquecida (1956).
A narrativa tem depoimentos dos filhos que não demonstram amarguras,
a começar pela filha mais velha, Pia, seguindo pelos outros irmãos; passa por
depoimentos de atrizes consagradas como Liv Ullmann e Sigourney Weaver; ocupa
espaços como se a própria protagonista efetuasse a leitura dos textos com boa
dose de emoção, num tom ficcional com muito realismo das encenações bem representadas
pela voz da personagem-narradora (Alicia Vikander), ajudado pelas
imagens antigas em 8 mm ,
num tom agradável como de um sonho transcendental. Björkman tem um olhar maduro
e equidistante para mostrar os fatos numa cronologia sem ser didática, mas que
imprime boa velocidade num clímax certeiro sobre a vida de Ingrid Bergman
(1915-1982), ao perder a mãe com 3 anos, sofre o impacto da morte do pai com14
anos, por quem nutria um grande amor e a herança da paixão pelo cinema. A
trilha sonora é adequada ao clima nostálgico, cria-se uma atmosfera de
reminiscências para as passagens da grande ascensão, alguns tropeços pelos
caminhos como o boicote pelos estúdios, em que beirou o abandono da carreira,
até chegar ao epílogo da existência.
Eu Sou Ingrid Bergman
retrata as passagens que se sucedem, principalmente a determinação para lutar
contra o conservadorismo de uma época para uma mulher que queria ser livre, imprimindo
muita coragem para enfrentar as rígidas regras morais dos anos 1940 e 1950.
Ressalte-se que não há pelo diretor o intuito de colocar julgamentos morais às
atitudes da estrela. Transparece um relato mais afinado com os ideais feministas
na defesa da mulher de espírito libertário, sem amarras, poucas raízes de
vínculos afetivos maternais, na qual definia-se como “um pássaro migratório”,
dona da escolha de seu destino, afirmava que: “não se arrependia de nada do que
fizera, mas pelo que não fez”. Um belo tributo para uma atriz que estava bem à
frente de seu tempo. Mas ao filmar os quatro filhos sem mágoas ou
ressentimentos do passado da mãe, o cineasta retrata a fantasia decorrente da beleza
de uma celebridade de espírito criativo e intenso, nesta reverência familiar
para uma diva dedicada exclusivamente ao cinema como elementos de amor e paixão
pela vida, e, pelo que fez, que se fundem como uma simbiose. Um filme sobre a trajetória
de viver marcada por ensinamentos reflexivos e existenciais nada convencionais
num passeio pela história do cinema e seu fascínio, como uma aula acoplada para
os apreciadores mais devotados.
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