A cinematografia pernambucana é um polo fortíssimo de produzir e a
safra inesgotável traz mais uma obra, desta vez com a assinatura do estreante
Daniel Aragão, realizado em 2012, Boa
Sorte, Meu Amor foi ganhador do prêmio de melhor filme do júri jovem do
Word Cinema Amsterdam. É uma abordagem sobre o presente e um passado bem
próximo do urbano contrastando com a zona rural que aparentemente ficou para
trás. Um relato em três atos sequenciais, com alguns exageros técnicos sobre duas
vidas oriundas do Sertão de Pernambuco que se encontram por acaso na noite da
badalada Recife. A cidade sofre com suas construções desenfreadas, passando por
cima de um plano diretor inexistente e sem planejamento imobiliário que acena
para um novo perfil com arranha-céus majestosos.
O drama enfoca uma jovem apaixonada pela música e que tem no
piano sua válvula de escape para lutar pela vida, tal qual Frances adorava a
dança e pretendia ser bailarina profissional na comédia Frances Ha (2012), de Noah Baubach. Maria (Christiana Ubach)
encontra numa noite qualquer o playboy Dirceu (Vinicius Zinn), um aristocrata
em plena decadência financeira que trabalha numa empresa de construção. Aragão
mostra os dois assistindo a transformação predatória da Capital dos
pernambucanos, como uma mudança iminente de um cenário do futuro. Estão
complacentes com tudo o que veem, tal qual um espelho que reflete nas águas e
muda os destinos de toda uma população inebriada.
O longa começa contando a história dos horrores que o barão,
tetravô de Dirceu, praticava com as indiazinhas, exceto uma que sobreviveu e
assumiu o lugar da tetravó ao morrer. Mostra como uma mulher inteligente usa de
suas astúcias na cama para conquistar um homem, numa época de senhores
usineiros donos de terras que tinham o poder absoluto e incontestável,
repassado aos descendentes que carregam no sangue e nas costas uma culpa
ancestral.
O terceiro e último ato busca dar uma solução para o
relacionamento tortuoso do casal em Recife, advindo de uma relação às avessas,
decorrente de uma errante paixão que beira a inverossimilhança. Onde está
Maria? O playboy tira a máscara e vai tentar encontrar a amada na zona rural,
numa espécie de busca das raízes no Sertão que ficaram para trás. Um mergulho
no passado e o encontro com pessoas pobres e desesperançadas numa casa humilde
dos familiares da moça. Prevalece a pouca conversa e sem respostas para as perguntas,
como um ato de redenção e culpa. Uma busca quixotesca e com passagens
simbólicas como: o cavalo que morre no meio da rua; ou do garoto que some
dentro d’água num lago; e ainda a senhora que não enxerga por estar com a visão
tapada.
Eis um filme que está longe do fabuloso O Som ao Redor (2012), de Kleber Mendonça Filho, que lhe rendeu o
prêmio da Crítica no Festival de Roterdã, na Holanda, o Kikito em Gramado de
melhor direção de 2012 e o título de melhor filme no Festival do Rio, ou do bom
e instigante Na Quadrada das Águas
Perdidas (2011), de Wagner Miranda e Marcos Carvalho; bem como de Árido Movie (2005), de Lírio Ferreira; Cinema, Aspirinas e
Urubus (2005) e Era uma Vez Eu,
Verônica (2012), ambos de Marcelo Gomes; Baixio das Bestas (2006) e Febre
do Rato (2011), de Cláudio Assis.
A fotografia em preto e branco está se tornando rotineira
novamente. Vários são os filmes que usam desta técnica como desculpa para o
realismo cênico, embora nem sempre o resultado seja o esperado, como neste Boa Sorte, Meu Amor, com imagens
completamente desfiguradas e sem nitidez. Porém, muitos filmes foram exitosos e
se justificou a falta de colorido, entre eles Branca de Neve (2012), do espanhol Pablo Berger; ou no oscarizado O Artista (2011), do francês Michel
Hazanavicius; e ainda no fabuloso Tabu (2012), do português Miguel Gomes,
e por último a comédia Frances Ha. Para
corroborar com os desacertos da produção, uma escolha de elenco decepcionante,
pois tanto Chistiana como Vinicius estão frágeis em suas interpretações do
casal amargurado. Ambos estão fora de sintonia com o drama, sem expressão
dramática razoável, estando mais para dois zumbis flutuando pelo cenário.
O cineasta perde-se em alegorias, simbologias metafóricas e
a utilização da não-narrativa de várias formas em encontros e desencontros na
Capital, para ir até o Sertão. Glauber Rocha demonstrara bem em seu inventivo
cinema novo com metáforas soberbas sobre a seca e a aridez das caatingas e a
morte dos animais por falta de água. Há uma falta de fluidez do drama com
soluções estéreis e confusas, passando longe do pragmatismo que pudesse levar a
conclusões lógicas. Optou por um apuro técnico e a inclusão de planos e
contraplanos excessivos, onde até o silêncio extrapola o bom senso e ao invés
de uma reflexão sobre os contrastes de poder e a sobrevivência, acaba por
soçobrar diante de um enfadonho experimentalismo que leva a lugar nenhum.
Faltou cinema e principalmente emoção no existencialismo sonolento de uma
nostalgia ultrapassada.
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