quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Boa Sorte, Meu Amor















Amargo Romance

A cinematografia pernambucana é um polo fortíssimo de produzir e a safra inesgotável traz mais uma obra, desta vez com a assinatura do estreante Daniel Aragão, realizado em 2012, Boa Sorte, Meu Amor foi ganhador do prêmio de melhor filme do júri jovem do Word Cinema Amsterdam. É uma abordagem sobre o presente e um passado bem próximo do urbano contrastando com a zona rural que aparentemente ficou para trás. Um relato em três atos sequenciais, com alguns exageros técnicos sobre duas vidas oriundas do Sertão de Pernambuco que se encontram por acaso na noite da badalada Recife. A cidade sofre com suas construções desenfreadas, passando por cima de um plano diretor inexistente e sem planejamento imobiliário que acena para um novo perfil com arranha-céus majestosos.

O drama enfoca uma jovem apaixonada pela música e que tem no piano sua válvula de escape para lutar pela vida, tal qual Frances adorava a dança e pretendia ser bailarina profissional na comédia Frances Ha (2012), de Noah Baubach. Maria (Christiana Ubach) encontra numa noite qualquer o playboy Dirceu (Vinicius Zinn), um aristocrata em plena decadência financeira que trabalha numa empresa de construção. Aragão mostra os dois assistindo a transformação predatória da Capital dos pernambucanos, como uma mudança iminente de um cenário do futuro. Estão complacentes com tudo o que veem, tal qual um espelho que reflete nas águas e muda os destinos de toda uma população inebriada.

O longa começa contando a história dos horrores que o barão, tetravô de Dirceu, praticava com as indiazinhas, exceto uma que sobreviveu e assumiu o lugar da tetravó ao morrer. Mostra como uma mulher inteligente usa de suas astúcias na cama para conquistar um homem, numa época de senhores usineiros donos de terras que tinham o poder absoluto e incontestável, repassado aos descendentes que carregam no sangue e nas costas uma culpa ancestral.

O terceiro e último ato busca dar uma solução para o relacionamento tortuoso do casal em Recife, advindo de uma relação às avessas, decorrente de uma errante paixão que beira a inverossimilhança. Onde está Maria? O playboy tira a máscara e vai tentar encontrar a amada na zona rural, numa espécie de busca das raízes no Sertão que ficaram para trás. Um mergulho no passado e o encontro com pessoas pobres e desesperançadas numa casa humilde dos familiares da moça. Prevalece a pouca conversa e sem respostas para as perguntas, como um ato de redenção e culpa. Uma busca quixotesca e com passagens simbólicas como: o cavalo que morre no meio da rua; ou do garoto que some dentro d’água num lago; e ainda a senhora que não enxerga por estar com a visão tapada.

Eis um filme que está longe do fabuloso O Som ao Redor (2012), de Kleber Mendonça Filho, que lhe rendeu o prêmio da Crítica no Festival de Roterdã, na Holanda, o Kikito em Gramado de melhor direção de 2012 e o título de melhor filme no Festival do Rio, ou do bom e instigante Na Quadrada das Águas Perdidas (2011), de Wagner Miranda e Marcos Carvalho; bem como de Árido Movie (2005), de Lírio Ferreira; Cinema, Aspirinas e Urubus (2005) e Era uma Vez Eu, Verônica (2012), ambos de Marcelo Gomes; Baixio das Bestas (2006) e Febre do Rato (2011), de Cláudio Assis.

A fotografia em preto e branco está se tornando rotineira novamente. Vários são os filmes que usam desta técnica como desculpa para o realismo cênico, embora nem sempre o resultado seja o esperado, como neste Boa Sorte, Meu Amor, com imagens completamente desfiguradas e sem nitidez. Porém, muitos filmes foram exitosos e se justificou a falta de colorido, entre eles Branca de Neve (2012), do espanhol Pablo Berger; ou no oscarizado O Artista (2011), do francês Michel Hazanavicius; e ainda no fabuloso Tabu (2012), do português Miguel Gomes, e por último a comédia Frances Ha. Para corroborar com os desacertos da produção, uma escolha de elenco decepcionante, pois tanto Chistiana como Vinicius estão frágeis em suas interpretações do casal amargurado. Ambos estão fora de sintonia com o drama, sem expressão dramática razoável, estando mais para dois zumbis flutuando pelo cenário.

O cineasta perde-se em alegorias, simbologias metafóricas e a utilização da não-narrativa de várias formas em encontros e desencontros na Capital, para ir até o Sertão. Glauber Rocha demonstrara bem em seu inventivo cinema novo com metáforas soberbas sobre a seca e a aridez das caatingas e a morte dos animais por falta de água. Há uma falta de fluidez do drama com soluções estéreis e confusas, passando longe do pragmatismo que pudesse levar a conclusões lógicas. Optou por um apuro técnico e a inclusão de planos e contraplanos excessivos, onde até o silêncio extrapola o bom senso e ao invés de uma reflexão sobre os contrastes de poder e a sobrevivência, acaba por soçobrar diante de um enfadonho experimentalismo que leva a lugar nenhum. Faltou cinema e principalmente emoção no existencialismo sonolento de uma nostalgia ultrapassada.

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