sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

As Sessões

















Poesia com Persistência

O longa-metragem As Sessões é um instigante drama com um bom humor refinado, que conta a história real da vida do escritor e poeta americano Mark O’Brien (1949-1999), interpretado pelo inspirado ator John Haukes, de atuação soberba e irretocável nos mínimos detalhes das minúcias e trejeitos da expressão física deformada de um protótipo aleijado; é o mesmo caipira assustador que atuou no filme Inverno da Alma (2010), de Debra Granik, indicado ao Oscar há dois anos. O diretor polonês Ben Lewin também foi vítima da mesma enfermidade quando criança, que lhe deixou sequelas e o faz andar de muletas, razão pela qual conhece bem a situação abordada.

O filme retrata a iniciação sexual do escritor, tendo em vista que na infância foi afetado pela poliomielite aos seis anos, que lhe retirou seus movimentos, exceto a cabeça que conseguiu girar, deixando-o paraplégico com uma vida quase vegetativa, pois está sempre deitado e respira através de um pulmão de aço ligado nas máquinas que o auxiliam no seu dia a dia. Faz frequentes visitas à igreja e tem no padre (William H. Macy) o seu confidente e conselheiro, assegurando-lhe que a iniciativa de buscar o sexo sem amor não é pecado, indicando-lhe uma terapeuta (Helen Hunt- mesmo discreta no papel, foi indicada ao Oscar como melhor atriz coadjuvante) para superar suas dificuldades físicas e as fragilidades inerentes de um homem, por sofrer de timidez e os temores são muitos, mas a persistência é seu lema para alcançar o objetivo maior que é a busca da forma do aprendizado para a sexualidade.

Um drama sobre uma deficiência física irreversível de um homem que quer relacionar-se sexualmente com uma mulher. Há na direção competente uma condução com suavidade e ternura na trajetória do personagem, como se fosse um percurso realizado por um determinado corpo no espaço, com base em um sistema coordenado e pré-definido, onde o vínculo afetivo entre a profissional e o paciente parece ser inevitável na abordagem, mas os parâmetros ficam evidenciados e pré-estabelecidos entre ambos para ser cumprido à risca, sob pena do resultado ser prejudicado e fracassar.

As Sessões é baseado no conto do escritor sobre a sexualidade efetiva em pessoas deficientes físicas. O tema é serio e o cineasta ao optar pelo tom cômico não esvazia a complexidade dramática da trama, muito pelo contrário, prende ainda mais o espectador. Há alguma similitude com o longa Intocáveis (2011), de Eric Toledano e Olivier Nakache, onde havia uma inesperada amizade entre um tetraplégico e um ex-assaltante de uma joalheria, que buscava seu reingresso social; porém sem a sisudez e o desconforto do relato de O Escafandro e a Borboleta (2007), de Julian Schnabel, que abordava um homem apaixonado pela vida, mas subitamente tem um derrame cerebral, acorda e se depara com uma rara paralisia. E o único movimento que lhe resta no corpo é o do olho esquerdo, comunica-se piscando letras do alfabeto e cria um mundo próprio, contando com aquilo que não paralisou: a imaginação e a memória; ou ainda do bizarro e inverossímil drama japonês Carterpillar (2010), de Koji Wakamatsu, numa reflexão sobre os efeitos nefastos e devastadores da sobra mutilada de um ser humano, resultantes da dor e da demagogia da guerra, decorrendo ódio e irresignação daquela que tem que lhe servir sexualmente, lavar e fazer sua higiene pessoal, dar comida e bebida compulsivamente.

A película é uma notável artimanha para mostrar que um deficiente paralítico pode sim ter vida normal e se satisfazer sexualmente com sua parceira, embora haja dificuldades e grandes percalços no caminho árduo, Lewin dá um tom emocional contido e sem pieguismo, com extrema sensibilidade na erotização de seu personagem. É difícil não torcer por O’Brien que busca na poesia e na sedução a fórmula adequada para obter o objetivo maior que é perder a virgindade e ser um homem realizado.

Embora simples na sua estética, deixando as metáforas afastadas do enredo, vai direto ao ponto pela ótica da comicidade, tendo como ingredientes essenciais: a poesia, o sexo, a vida e a morte do protagonista, resumida na comovente homenagem realizada na missa pelo padre, um mero interlocutor das palavras do escritor para as mulheres que o entenderam de alguma forma e o fizeram uma pessoa morrer quase que totalmente feliz. Há evidências de desprendimentos e a refutação de quaisquer tipos de ressentimentos, com notáveis cenas emotivas flutuando entre os espectadores, pelo olhar atento deste veterano cineasta que flerta com a sensibilidade e a compaixão, através de uma luz lançada na humanidade pelos méritos inegáveis ao abordar uma relação solidária de duas pessoas, além da gratidão e superação, nesta obra magnífica que se afasta do politicamente correto para buscar a alegria de viver.

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