quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Tetro
















Melodrama Familiar

Francis Ford Coppola realizou seu 21º. longa-metragem com Tetro, produção rodada no bairro La Boca, em Buenos Aires, e na região da Patagônia, na Argentina, sendo seu primeiro roteiro original desde A Conversação. É uma abordagem sobre as fraturas familiares, as distenções dos seus membros e os conflitos inerentes entre pais, filhos e irmãos, numa ótica convencional e de profundidade escassa, longe de suas grandes realizações do passado, como a trilogia de O Poderoso Chefão (1972, 1974 e 1990), Apocalypse Now (1979), O Selvagem da Motocicleta (1983), A Conversação (1974; porém, bem mais próximo dos fracassos como Velha Juventude (2007 - inédito no Brasil), O Fundo do Coração (1982) e Vidas sem Rumo (1983), entre tantas decepções.

A trama é baseada em sua própria família, como admitido nas entrevistas concedidas no Brasil, seguindo uma linha autobiográfica. Começa com a visita ao escritor recluso e sem sucesso, desaparecido dos EUA há mais de uma década, o irascível Tetro (Vincent Gallo), casado com a portenha (Maribel Verdú), pelo seu suposto irmão mais novo Bennie (Alden Ehrenreich), um jovem de 17 anos, que vai procurá-lo em Buenos Aires. A fuga de casa tem um segredo familiar e um mistério guardado a sete chaves. Já na recepção, fica evidente a frieza do encontro e a falta de afeto de Tetro para com Bennie, cobrado por este, na cena em que seu irmão se derrete de gentilezas e amabilidades familiares com pessoas desconhecidas, visivelmente para agredi-lo.

Aos poucos o nó vai se desatando e as revelações vão aflorando e desmistificando uma realidade sombria e nefasta, com a dureza impregnada naquela criatura perturbada, que guarda o enigma de seu pai autoritário à beira da morte, radicado em Nova York, tendo sido no passado um homem poderoso e egoísta, na pele do maestro famoso e inescrupuloso Carlo Tetrocini (Klaus Maria Brandauer, em grande atuação). Não é à toa que Coppola centra na figura do maestro, pois há a explicitude do resgate do seu pai, que era também um músico. O conflito arrasador entre pai e filho se estabelece no drama, afastando o filho mais velho definitivamente de um futuro promissor, ofuscado pela figura paterna que o atormenta e dilacera, mantida no silêncio, mas demonstrada na agressividade peculiar e nos seus escritos todos guardados nas malas de viagens.

O uso inadequado da ópera se mesclando com os rascunhos do longa Tetro e concluídos às pressas por Bennie indicam uma confusa salada de fruta, mal aproveitada e sem demonstração de força e vigor, num roteiro que se esvai e se perde num Festival de Teatro na Patagônia, em que é presidido pela escritora e crítica Alone (Carmem Maura), que inicia e termina tudo na mesma noite, de forma absurda e ridícula, com o intuito da premiação barata do herói que surge do nada e abocanha um prêmio já previsível chamado ironicamente de Parricida. O drama foge do contexto realista e da análise pontual que se espera de um diretor autoral, inclinando-se para um final convencional e pouco inteligente, naufraga e mergulha num melodrama novelesco.

O filme segue um caminho de acomodação pueril, embora tente rejeitar sua própria estrutura proposta de conflito familiar, falta o clímax e a profundidade de outras obras de outrora, neste que foi um extraordinário diretor que se notabilizou pela ambição e criatividade, dá sinais evidentes de que sua fonte parece ter secado, pois ainda que tenha buscado com todo o esforço, está cada vez mais distante daquelas películas que o consagraram, restando a impressão de esgotamento definitivo da inspiração, aparecendo somente a transpiração. Coppola tentou dar seguimento da sua filmografia marcada por belos dramas, parecendo num primeiro momento que iria conseguir se soltar das amarras dos fracassos, nos cenários e nas falas elaborados num rigor bem ao seu melhor estilo, optando pela magnífica fotografia em preto e branco uma tentativa válida e interessante, deixando o colorido das cenas para os flasbacks, como uma espécie de recordação e saudade dos tempos áureos. Mas o roteiro vai se desmanchando pela fragilidade e inconsistência dos personagens, deixando a indecisão se sobressair e a previsibilidade arrebatar o final.

É evidente que a grande revelação que se aguardava para o epílogo torna contraditório um filme realizado com pretensões maiores, tornando-o um grande novelão com um final lamentável, com mocinhos e bandidos, revelações dignas do padrão global, com direção de Daniel Filho; ou ainda quem sabe dos filmes-novelísticos do francês Claude Lelouch, não condizentes para um cineasta da capacidade de Francis Coppola. Apesar que a figura de Édipo fosse tentada com todo esforço na tragédia familiar, nos relacionamentos incestuosos explícitos e implícitos, tudo se perde e vira pó pela ingenuidade do final.

Só resta aguardar pelo próximo longa prometido pelo cineasta, rezar e fazer algumas promessas para que haja a tão esperada reabilitação deste singular diretor, mas atualmente em franca decadência de inspiração.

Um comentário:

@cinemacombr disse...

De um certo ponto você tem razão com relação ao roteiro deste filme. Poderia ter um pouco mais de criatividade nas ultimas cenas, principalmente por ser previsivel no climax de Império Contra-Ataca. De qualquer forma o longa tem muitos outros otimos pontos a serem apreciados como a trilha e a fotografia por exemplo.