sexta-feira, 13 de agosto de 2010
À Prova de Morte
Homenagem aos Maus Filmes
Quentin Tarantino que se consagrou com Cães de Aluguel (1992), Pulp Fiction (1994), Kill Bill vol. 1 (2003), Kill Bill vol. 2 (2004), e recentemente com a assumida e possível obra-prima Bastardos Inglórios (2009), agora homenageia os filmes de categoria B e C, colocando na planície da diversão atores e atrizes que buscam a fama. A inspiração vem do seu longa Jackie Brown (1997), com as mulheres reagindo e buscando a vingança numa força descomunal ao detrator corroído pela aversão ao sexo feminino.
Tarantino é um obsessivo pelas realizações de subterrâneo, pois cresceu investigando as locadoras e assistindo tudo que lhe caía na mão, recicla agora este tipo de produções baratas e ruins, de truques fáceis, temas de vulgaridade expressiva para prestar uma gloriosa homenagem com sua penúltima obra À Prova de Morte (2007), com seu parceiro Robert Rodriguez um duplo longa-metragem que posteriormente se dividiu em dois. Coube a Rodriguez o fracasso com Planet Terror, no projeto Grindhouse, exibido originalmente no Festival de Cannes em 2007, com 127 minutos.
À Prova de Morte tem na estética uma alusão explícita, incluindo os defeitos do gênero, como a cor amarelo/alaranjado num contraste desbotado repleto de riscos nos personagens, os erros de continuidade, com diálogos equivocados e cheios de mesmices, não podendo faltar o tradicional banho de sangue, pelas corridas alucinadas de carros por estradas sem asfalto, muita velocidade e choques violentos e devastadores, com socos e porradas na cara ao melhor estilo.
A narrativa da perseguição do dublê Stuntman Mike (Ken Russel) que está ótimo como um autêntico serial killer na insana perseguição para matar belas garotas em dois atos, sendo bem sucedido no primeiro, predominando uma tensa busca desenfreada com seu carro "envenenado"; mas sofrendo um revés estrondoso no segundo ato, diante da reação espetacular das garotas, em planos de ação e transtorno pelo encalço nas estradas desertas de grande qualidade.
Cabe frisar que as perseguições que lembram os filmes do gênero, como o clássico dos anos 60 Sem Destino (1969), dirigido por Dennis Hopper, com atuação impecável de Peter Fonda; o outro é um cult do gênero, o notável O Encurralado (1971 ), primeiro longa-metragem de Steven Spielberg, nas antológicas cenas de perseguição, por uma estrada empoeirada, de um caminhão assustador tendo na direção um motorista sem imagem, correndo loucamente atrás de um homem de negócios dentro de um carro esporte, com a única intenção de matá-lo impiedosamente.
Tarantino aborda com sabedoria a busca da fama por atrizes neófitas que estão se projetando no mundo do cinema, repletas de sonhos e esperanças, ainda românticas no início, mas já na cena final buscam a igualdade completa com os homens, assim como no filme Thelma & Louise (1991), dirigido magnificamente por Ridley Scott, retratando a busca da liberdade de uma mulher casada em conflito com seu marido, que resolve viajar com sua melhor amiga numa aventura fascinante.
O cenário "retrô", numa volta ao passado com seu estilo de sugestão para recuperar as glórias de outrora nos bares esfumaçados de beira de estrada, com muita bebida num ambiente de filmes de faroeste. Tarantino aparece na primeira cena num bar e depois em outras, tal qual Alfred Hitchcock também dava os ares da graça em seus filmes por alguns segundos. Em seguida, para mostrar que ele estava ali presente já projetando sua marca registrada, vem a cena da perseguição do maníaco destroçando o carro que tinha como alvo, com muito sangue e membros superiores e inferiores jogados no chão, sem transparecer violência gratuita, causando ironicamente até alguns sorrisos na plateia, diante do inusitado.
O diálogo do xerife com seu assistente no hospital, após intimar a médica sobre o estado de saúde do paciente perseguidor revela os problemas e as fragilidades do sistema, e em especial da justiça, no julgamento com poucas provas. O diretor joga na plateia a sensação de impunidade e fraqueza dos órgãos repressores com formato oficial.
A cena da perseguição das jovens chamando o maníaco de bastardo por várias vezes, já antevê o próximo filme que viria arrasar: Bastardos Inglórios. Já o tratamento dado ao serial killer demonstra que em tais situações, sem ser fascista, se resolve de modo próprio, invertendo a ordem dos fatores, passando de caçador para caça, vem revelar a fraqueza comovedora daquele homem com desvio comportamental, tal qual previsto na cena em que se aproxima das garotas, é classificado de "possuidor de pinto pequeno", afasta-se imediatamente com seu carro turbinado esbanjando truculência.
Tarantino se diverte com as produções ruins, ridiculariza o sistema, através do tributo aos filmes B e C, tanto pelo cenário com cores pigmentadas e desbotadas, presta sua homenagem aos diretores que tanto aprecia deste gênero, como Dario Argento, Don Siegel, George Romero e Russ Meyer, diante dos heróis fortões de rostos cortados com cicatrizes enormes. Se não é seu melhor longa, há a admiração e os respeito venerado aos espectadores que se criaram- assim como diretor- assistindo películas menores e de poucos recursos, com atores ainda desconhecidos na busca da consagração, cheios de imaginações e suspiros por um estrelato no ápice da carreira. Impossível deixar de gostar e se imaginar assistindo aos filmes tributados, como numa volta ao passado, todos fazem seu mea-culpa, ou saem gostando ainda mais do que vira nas décadas de 60 e 70.
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