quinta-feira, 19 de abril de 2012

Xingu

















Os Lendários Villas Bôas

No ano passado o Parque Nacional do Xingu completou 50 anos, localizado no Centro-Oeste do Brasil, fundado em 14 de junho de 1961, através de Decreto-Lei do então presidente Jânio Quadros. É a maior reserva indígena com 27.000 quilômetros quadrados, do tamanho da Bélgica, criado graças ao trabalho dos irmãos Villas Boas: Cláudio (João Miguel), Leonardo (Caio Blat) e Orlando (Felipe Camargo), todos com menos de 30 anos, alistaram-se na Expedição Roncador-Xingu, que iria cumprir uma jornada pelo interior do Brasil, começando no sugestivo nome do Rio das Mortes. Logo os irmãos foram guindados ao comando da empreitada árdua, um desafio que começou em 1944 pelas matas brasileiras, numa defesa ferrenha dos índios e seus conflitos tribais e divergências com o homem branco, mas notório invasor dos territórios indígenas.

Aproveitando mote do cinquentenário aniversário do Parque, o diretor Cao Hamburger, o mesmo de O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (2006), rende uma bonita homenagem e conta a saga épica dos Villas Boas. O longa Xingu busca situar as dificuldades desta aventura juvenil no contexto nacional. Ou seja, quando tudo parecia estar resolvido amigavelmente em 1961, em pleno regime democrático, com a concessão das terras por decreto pelo intempestivo presidente renunciante, ao criar a reserva indígena tão desejada, houve o golpe militar em 1964.

O início dos problemas e dificuldades de assentamento dos povos tribais aflora com uma verdadeira rebelião de insatisfação entre o Centro-Oeste e a Amazônia, diante da construção da fatídica e mal planejada Ferrovia Transamazônica, com os conflitos protagonizados pelos homens brancos ditos civilizados, onde peões e jagunços estimulados pelo Exército num enfrentamento desproporcional com os índios defendidos ferozmente por Cláudio, Orlando e Leonardo que logo se evadiu da missão por um envolvimento com uma indiazinha, vindo a falecer após por um infarto fulminante.

O filme mostra as vicissitudes decorrentes do choque de civilizações entre o branco e o indígena, acarretando na epidemia da gripe que dizimou os nativos indefesos e não acostumados com a doença dos invasores, uma população enganada e ludibriada com promessas de territórios para se estabelecerem, mas não passando de um grande blefe, onde os irmãos resistentes também foram usados ingenuamente, caindo em armadilhas bem arquitetadas pelo Governo Militar instalado na época.

Um elogio que se faz necessário é para o ator João Miguel como o idealista Cláudio, sempre ótimo, assim como o fora em Cinema, Aspirinas e Urubus (2005), Mutum (2007) e Estômago (2007). Outra grande surpresa positiva foi para o desempenho impecável de Felipe Camargo encarnando Orlando, o mais intelectual e popular dos manos, bem mais comedido e demonstrando recursos pouco conhecidos do público, sendo o grande interlocutor dos índios em Brasília, na sua causa legítima e justa em defesa dos silvícolas.

Xingu é um filme que conta em tom documental, embora não seja um simples documentário, classificado como uma aventura épica, pelas conquistas e desbravamentos das matas virgens e inóspitas pelos Villas Boas, resgata as conquistas e dissabores desses bravos aventureiros que abriram pistas de pouso no meio da floresta, tendo o fim prematuro do irmão mais jovem. Não chega a atingir um clímax de dramaticidade esperado, diante do retrospecto exitoso de Hamburger.

O cineasta ficou mais nos relatos e dados estatísticos, afastando-se de um envolvimento mais profundo de um cinema de denúncia, pois sequer confronta ou refuta dados oriundos dos militares. Está bem abaixo do aguardado filme de um diretor que brilhou na sua obra anterior, mas que desta feita foi burocrático e não se expôs, deixando fluir belas imagens de uma fotografia esplendorosa, num resultado final apenas razoável e sem maiores revelações, contestações ou algo que pudesse ter uma consequência corrosiva. Ainda assim é louvável o tributo aos irmãos Villas Bôas pela trajetória truncada e estigmatizada pelos governantes divorciados das causas dos povos indígenas.

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