terça-feira, 10 de abril de 2012

Um Método Perigoso



Freud e Jung

O canadense David Cronenberg é um diretor dinâmico em sua trajetória cinematográfica. Realiza filmes de terror como A Mosca (1986), embora assustador, mas ao mesmo tempo extremamente cativante e romântico; mas nos ótimos dramas Marcas da Violência (2005) e Senhores do Crime (2007), busca um cinema voltado para a denúncia social, a corrupção e o medo como temas mais palatáveis, embora realizados com bastante crueza. Agora com Um Método Perigoso dá uma guinada para o drama psicológico, encenando de forma astuta e inteligente a discórdia do mestre austríaco e pai da psicanálise Sigmund Freud (1856-1939) com o seu discípulo suíço Carl Jung (1875-1961), representados brilhantemente por Viggo Mortensen e Michael Fassbender, respectivamente em seus papéis.

O mote da trama é a relação pessoal conflitada profissionalmente dos dois maiores psiquiatras de todos os tempos, após o encontro inaugural de 13 horas de conversa, no dia 27 de fevereiro de 1907, colocadas de forma ficcional entre o jovem psicanalista Jung, que começa um tratamento inovador na histérica Sabina Spielrein (Keira Knigthley- considerada exagerada por alguns críticos, sua atuação é perfeita), ao chegar no sanatório de Zurique, em 1904. A paciente judia-russa é tratada com métodos de flagelo e demonstra gostar da humilhação, diante das revelações que sentia prazer em ser torturada pelo pai com castigos físicos violentos, como uma típica Electra satisfeita. Ela, uma futura médica na Rússia, senta-se de costas para Jung nas sessões rotineiras, acaba por ser o pivô do rompimento do discípulo com Freud, pois ao penetrar com mais afã nos mistérios da mente humana, vê suas teorias irem de encontro com as do mestre, sendo suas ideias rebatidas por serem contrastantes e chocando-se frontalmente com as do professor que coordenava o tratamento por cartas no início do século 20.

O longa mostra Freud rompendo a amizade e desistindo de levar adiante a intenção de fazer Jung seu sucessor, embora lhe doesse muito, também não aceita e critica o colega pelo seu envolvimento emocional e antiético num romance com a paciente. Os contratempos pelas divergências de postura e métodos de trabalho são fatores exponenciais para ficarem de lados opostos, inclusive com a insinuação intempestiva da simpatia pelo Nazismo por Jung, sem se aprofundar logo se esvai, pois se Sabina e Freud eram judeus, as razões e métodos aplicados para a terapia da psicanálise deturpada não se pode confundir com antissemitismo de Jung e seu pragmatismo dissidente contrário à defesa da sexualidade e da libido defendida pelo mestre como uma psicanálise da conversa frontal como diagnóstico sem abandonar a fala, embora afirmasse ironicamente que um paciente nunca teria a cura total.

Cronenberg entra no terreno da psicanálise e os métodos usados pelos dois monstros sagrados. Apresenta as teses defendidas e controvertidas com as descobertas das fronteiras da alma do ser humano com um requinte bem apropriado de um cineasta maduro e liberto das amarras da ficção pueril ou comercial para um grande público, principalmente envolvendo a repressão e a libertação como antagonismos de uma boa e isenta reflexão. Mostra os conhecimentos técnicos de uma abordagem serena num roteiro bem elaborado, numa síntese de um filme contundente e com um resultado acima da média de certas mediocridades que assolam e pululam o mercado cinematográfico.

Um Método Perigoso é um longa que retrata com fidelidade a relação do mestre e do discípulo que se tornaram inimigos por um choque de pensamentos divergentes, afastando o maniqueísmo e as soluções fáceis, sem tomar partido da causa, embora exagere na afirmação de que Jung fora o maior psicanalista, talvez por preferência pessoal, num excesso perdoável. Eis um filme que se aprofunda com dignidade e vai ao encontro das mazelas e perturbações psíquicas e neuróticas inerentes dos mortais e insatisfeitos seres humanos, neste excelente drama reflexivo da psicanálise e suas teorias divergentes de um cinema autoral.

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