sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Uma Canção de Amor


















Amizade Acima de Tudo

Em 1942, a Tunísia foi invadida pelas forças nazistas do poderoso exército alemão de Adolf Hitler. Havia uma forte propaganda contra a França que na época mantinha a soberania sobre os tunisianos. Os nazistas acusavam os franceses de protegerem o povo judeu, propiciando-lhes estudar em boas escolas e não usar túnica, e boicotarem os muçulmanos que eram obrigados a vestirem-se de modo inadequado e sem oportunidades de frequentarem bons colégios, razão pela qual conseguia receber certa simpatia e trazer aliados para sua frente de combate. Espalhavam à população manifestos de apoio dos EUA e da Inglaterra à França, fazendo-de bons samaritanos e protetores dos sofridos norte-africanos. Este é o fulcro político principal do comovente filme Uma Canção de Amor, dirigido com exatidão por Karin Albou.

No meio da guerra, com o incessante espocar de bombas e os toques de sirenes ensurdecedores, há uma grande e digna amizade de duas jovens de 16 anos. Myrian (Lizzie Brocheré), com seus graúdos olhos azuis dentro de sua beleza infantil, é a judia que viviam na mesma comunidade, mas passou a dormir na casa de sua inseparável amiga muçulmana Nour (Olympe Borval), uma adolescente de olhar meigo e doce, de corpo juvenil, mas sedutora do primo prometido de casamento Khaled, que passa a ser um colaborador oportunista das terríveis forças alemãs no transcorrer do filme, entregando inclusive Myrian e sua mãe Tita (Karin Albou- que também dirige), fazendo-a perder o emprego e entregar a filha ao médico rico tunisiano Raoul, que também alia-se aos nazistas, traindo colegas e o seu povo indignado, com participação acentuada nas operações do campo de concentração e trabalhos forçados aos judeus.

O longa-metragem traz evidências de situações constrangedoras, arranhando até a amizade das duas garotas, como de Khaled que tenta forçar a ruptura do elo entre sua recém esposa com Myrian. Determina que Nour passe a ler o Alcorão, com passagens de ensinamentos contrários aos cristãos, onde deva converter-se ao islamismo, pois quem contraria o Deus Islã será punido pelo grave pecado. Mas há o pai, pessoa simples, porém de cultura e sabedoria invejáveis, quando aponta para o próprio Alcorão e outras parábolas e verdades que a fazem refletir sobre os valores da vida, como as ideias de negar o Cristianismo e abandonar sua amizade de infância. Cenas magníficas, que são retomadas pela diretora, pois já o fizera anteriormente no belo A Pequena Jerusalém (2005), onde prega um mundo de convivências harmoniosas entre muçulmanos e cristãos, judeus e árabes.

Uma Canção de Amor tem o viés da imparcialidade e o condão da isenção, afastando de vez todo e qualquer ranço religioso ou político. Sua neutralidade conduz e faz um notável filme. Coloca em xeque os dogmas das religiões para serem discutidos, sem eventuais preferências. Fica latente as irracionalidades e os seus contrastes com os interesses políticos de uma guerra patrocinada pela Alemanha, onde joga e se insinua maliciosamente para os muçulmanos. Os choques de deuses e religiões se misturam no conflito de um povo que tem seus País tomado e vilipendiado por outro.

A talentosa diretora consegue extrair de seu bom elenco, uma metáfora significativa da lealdade e do amor das meninas, contrastando com a truculência dos adultos e dominadores de um mundo tumultuado por interesses econômicos, políticos e religiosos. A pujança desta película fica entranhado na alma do espectador que absorve lentamente toda magia de um cinema voltado para o realismo e a denúncia.

O cenário é condizente com a época, numa bela fotografia e roteiro correto. Cabe gizar uma cena reveladora, ao mostrar de forma singular o sono de Myrian sendo interrompido pela orquestra das botas dos soldados ecoando pela madrugada, num prenúncio de dias tenebrosos e noites negras que virão.

Apenas a se lamentar, a meteórica passagem pelos cinema da capital gaúcha, ficando menos de 15 dias em cartaz.

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