sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Mostra de Cinema São Paulo (Morte em Sarajevo)


Morte em Sarajevo

O interessante Morte em Sarajevo foi outro filme bem aguardado e com boa expectativa de público e crítica na 40ª. Mostra de Cinema de São Paulo, vencedor do Grande Prêmio do Júri e do Prêmio da Crítica no Festival de Berlim, com direção e roteiro de Danis Tanovic, cineasta nascido na Bósnia-Herzegovina e criado em Sarajevo. O realizador tem em sua filmografia os prestigiados e importantes títulos do cinema do seu país, tais como: Terra de Ninguém (2001), seu primeiro longa e ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e o Prêmio do Público de Melhor Longa Estrangeiro na 25ª Mostra; também é dele o segmento Bósnia-Herzegovina do filme 11 de Setembro (2002, 26ª Mostra); O Inferno (2005, 29ª Mostra), Triage (2009), Cirkus Columbia (2010, 34ª Mostra), Um Episódio na Vida de um Catador de Ferro-Velho (2013) e Tigres (2014, 39ª Mostra).

Um drama sobre os conflitos étnicos da Bósnia, Sarajevo, Montenegro, Croácia e Sérvia que originou uma guerra civil entre os anos de 1992 a 1995. A causa foi por uma combinação complexa de fatores políticos e religiosos com um fervor nacionalista de crises políticas, sociais e segurança que se seguiu ao fim da guerra fria com a queda do comunismo na antiga Iugoslávia. Esta agitação ruidosa é o tema focado no cenário do Hotel Europe, em Sarajevo, para uma movimentada preparação para a festa de gala da União Europeia como manutenção da paz no continente, em memória do centenário do assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando pelas mãos de Gavrilo Princip. Mas há um grande entrave: os funcionários do estabelecimento planejam uma greve pelos dois últimos meses de salários atrasados, o que ocasiona um verdadeiro caos que poderá levar à falência o majestoso hotel cinco estrelas hipotecado para um banco e com dívidas astronômicas. Tudo depende deste importante jantar político que não pode dar errado com a presença da mídia internacional.

Em meio ao clima tenso está uma jornalista de Sarajevo que duela ao vivo num programa de televisão com um ativista da Sérvia, sobre as causas e efeitos oriundos desde 1914, que explodiram na ferrenha luta pela separação até o fim da Iugoslávia. O choque de opiniões leva para uma disputa árdua entre os dois, tirando o programa do ar, levando para um desfecho trágico com evacuação das dependências de todos os hóspedes e convidados famosos. As consequências são as piores possíveis e se complicam ainda mais com a deflagração da paralisação, diante do desaparecimento de um líder do movimento e o envolvimento direto de uma antiga funcionária da rouparia que trará indiretamente transtornos à sua filha despedida e assediada sexualmente pelo gerente.

O longa retrata um lugar belicoso que traz angústia e medo, no qual há seguranças armados que agem violentamente para manter a ordem e resolver as questões com ferocidade. Enquanto isto, como uma panela de pressão ideológica, há uma crescente crise que aumenta as tensões, passando pela recepção, lavanderia e cozinha até chegar à direção do estabelecimento. Nesta turbulência toda ainda há um ator (Jacques Weber) dedicado no quarto mais luxuoso, parece estar alheio à realidade, porém não consegue achar o tom correto em seu ensaio solitário, embora seu objetivo maior seja a representação adequada sobre os fatos de 1914. Os três eventos distintos: entrevista, greve e encenação, irão se interligar pelos fatos ocorridos e as consequências da crise financeira e política que fervilham e atingem o ápice, tendo em vista as dificuldades de se manter aberto aquele local. Mas se as coisas não andam pela transição forçada, chama-se a segurança para na base da truculência fazer andar. São métodos enraizados de violência explícita que ainda prevalecem naqueles homens rudes que cheiram pó.

O diretor se arrisca numa crônica de fatos marcantes recentes e os acontecimentos da Primeira Guerra Mundial, com personagens discutindo abertamente as circunstâncias do atentado, para refletir sobre a divisão dos povos, em que as etnias falam mais alto. Eis uma crise evidente e inatacável diante da guerra civil que por muitos anos permeou por ali. Tudo em nome da independência e da liberdade para ter seus espaços respeitados. Mas os reflexos chegaram com o agravamento da economia europeia em decomposição pedindo socorro. O roteiro falha nas exaustivas falas em Morte em Sarajevo, como por exemplo, a longa reportagem televisiva que menciona nomes e fatos pouco conhecidos do grande público, bem como exagera no discurso vazio e repetitivo do ator em seu quarto defendendo a velha Europa. Um bom filme que tem alguns méritos ao passar a limpo a história e as consequências dos reflexos iminentes, embora excessivo no didatismo, como a alegoria do encontro e a discussão entre uma bósnia e um sérvio numa guerra sem pausa que nunca termina. Tanovic ficou devendo uma realização mais consistente e menos alegórica.

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