Caminhos da Juventude
Cristiane Oliveira – não confundir com a atriz que celebrizou a personagem Juma na novela Pantanal – ficou conhecida com o drama familiar Mulher do Pai (2015), que venceu os prêmios de Melhor Diretor, Melhor Atriz Coadjuvante (Verónica Perrotta) e de Melhor Fotografia no Festival do Rio 2016. Abordava uma adolescente que precisava cuidar do pai cego, após a morte da avó que os criou como irmãos. Quando o genitor percebe o amadurecimento da filha, surge uma grande intimidade na relação afetiva, mas com a chegada de sua namorada, o ciúme tomará uma proporção enorme na vida deles. O segundo longa-metragem da cineasta gaúcha, A Primeira Morte de Joana, estreou no 51º. International Film Festival of India, em janeiro de 2021 e foi vencedor de 11 prêmios, nos mais de 35 festivais pelos quais passou, inclusive no Festival de Gramado com o Prêmio da Crítica. Foi ambientado no final do verão de 2007 na cidade de Osório, muito conhecida por seu parque eólico com 75 torres geradoras de energia, o imponente Morro da Borússia e dezenas de lagoas, onde foi criada a fictícia cidade de Lagoa dos Ventos, bem como teve locações nas belas paisagens do município de Santo Antônio da Patrulha, ambos no Rio Grande do Sul.
A trama, aparentemente é simples, embora haja uma razoável complexidade e comece a se delinear no seu desenrolar ao retratar as dúvidas e os caminhos que os adolescentes procuram em suas vidas futuras. O roteiro foi assinado pela diretora em parceria com Sílvia Lourenço, no qual focaliza a pré-adolescente de 13 anos, a criativa Joana (Letícia Kacperski), ao trilhar o típico período da transição entre a infância e a adolescência, faz com que ela viva os questionamentos e reflexões mais variados possíveis. A garota tenta entender uma dúvida que passa por sua cabeça do por que sua tia-avó (Rosa Campos Velho), uma mulher que nunca namorou e morreu virgem aos 70 anos de idade? Encara os valores da comunidade em que vive no Sul do Brasil, logo percebe que todas as mulheres do seu microcosmo familiar guardam segredos, o que traz à tona algo escondido para ela mesma, como da mãe separada (Joana Vieira) e sua avó (Lisa Becker).
Enquanto a trajetória da protagonista fica cada vez mais repleta de incertezas, uma grande usina eólica começa a ser construída na pequena cidade em que vive. A realizadora mostra a curiosidade desta situação, onde a personagem central lida com a realidade da perda e as diversas transformações que cercam a adolescência. Investiga a sexualidade, suas descobertas reveladoras, dividindo as dúvidas angustiantes ao lado de sua melhor amiga, Carolina (Isabela Bressane), que também passa por uma situação de separação dos pais. Oliveira segue o norte de outras realizações brasileiras sobre a temática do afável olhar da juventude e suas complexidades diante das primeiras manifestações da vida com suas variantes múltiplas que formam uma trajetória delicada, como abordado em Antes que o Mundo Acabe (2009), drama familiar com produção e direção da conterrânea porto-alegrense Ana Luiza Azevedo em seu filme de estreia. Há similitude em conteúdo de questionamento da infância em suas vidas futuras com outras belas obras, tais como: Os Famosos e os Duendes da Morte (2009), de Esmir Filho e o magnífico As Melhores Coisas do Mundo (2010), de Laís Bodanzky.
A Primeira Morte de Joana tem as peculiaridades típicas do interior, onde adolescentes andam de bicicletas, namoram, sonham, e os objetivos de vida estão limitados aos costumes de uma pacata cidadezinha de poucos recursos. Conhecer outros lugares e buscar voos maiores são sonhos que aos poucos são improváveis, mas a liberdade de vivenciar suas relações emocionais afetivas e sexuais que se sente atraída como opção é plausível e pode ser uma realidade palpável e bem próxima como o desfecho irá demonstrar. A insatisfação dolorida é latente nos rostos dos personagens, tanto nos adultos como nos jovens, como do pai ausente, da mãe e da avó em suas incursões amorosas. O longa reflete através da beleza das imagens num clímax de melancolia os prazeres e desprazeres da juventude no mundo rodeado pelos maiores de idade e suas andanças libidinosas. A relação de cordialidade e seu vínculo fortalecido nas amigas em contraste com os colegas de aula mergulham na abordagem do universo juvenil e sua difícil passagem para o mundo adulto repleto de preconceitos e complicações inerentes da transição, embora haja um vazio na dramaticidade dos personagens condensado no roteiro e suas falhas, deixando transparecer uma artificialidade latente, como na previsibilidade do epílogo após as descobertas investigativas da sobrinha-neta.
A promissora diretora acerta na sensível opção para abordar a temática dos jovens, mas se equivoca com as respostas de situações que beiram ao estereótipo de soluções de ordem prática previsíveis. Ainda que careça de amadurecimento, apresenta para reflexão uma ternura dolorida em ritmo lento, busca a atenção nos detalhes do tema sobre o entendimento do luto familiar num alicerce conservador, a sexualidade e suas descobertas, e o futuro logo ali como adultos. Há alguns méritos na condução do espectador para acompanhar um vínculo de importância aos personagens nativos envolvidos pelos fatos que se sucedem numa atmosfera criada em torno daquele bucólico lugarejo com seus costumes cultuados no dia a dia. Embora haja filigranas desnecessárias e uma emoção superficial cansativa nada inovadora, o espectador fica à vontade para tirar suas próprias conclusões neste longa com características minimalista de aparente simplicidade. A Primeira Morte de Joana tem uma construção de personagens com suas características infantis de um emocional forte na amizade, mas que paradoxalmente avança para uma solução pragmática e pouco criativa nesta realização de escasso esmero.
Um comentário:
"A Primeira Morte de Joana" fala sobre se descobrir diante mesmo em meio ao preconceito e cuja jornada pode ser ainda mais simples do que se imagina.Confira a minha crítica completa no meu blog de cinema
https://cinemacemanosluz.blogspot.com/2023/05/cine-dica-em-cartaz-primeira-morte-de.html
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