quinta-feira, 1 de julho de 2010

Em Teu Nome



Sonolenta Revolução

O diretor gaúcho Paulo Nascimento é um obstinado e trabalhador pela causa do cinema, especialmente no que se refere aos fatos e acontecimentos ligados ao Rio Grande do Sul. Sua trajetória é louvável pelo esforço e capacidade da dinâmica de tentar sempre, mesmo que seus produtos sejam refutados ou rejeitados pelos críticos e pelo grande público. Assim foi em Diário de um Mundo Novo (2005) e o decepcionante Valsa para Bruno Stein (2007), fracassos totais de público e hostilizados por boa parte da crítica especializada. Depois veio o filme infantil A Casa Verde (2009), sem receptividade dos espectadores, estreou em abril deste ano e logo saiu de cartaz, com passagem meteórica pelas salas, soçobrando como os anteriores, pela falta de criatividade de um produto melhor.

Finalmente chegou o tão esperado Em teu Nome, uma cinebiografia baseada na vida do jovem estudante de engenharia e ativista político, de origem humilde, nascido em Passo Fundo e hoje juiz da Justiça Militar gaúcha, João Carlos Bona Garcia (Leonardo Machado). Preso pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), logo após o Golpe Militar de 1964, por envolver-se com a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), que tinha seus ideais baseados na doutrina comunista de Che Guevara e Fidel Castro, sendo seu mentor e líder o capitão Carlos Lamarca, que veio liderar o célebre sequestro do embaixador suíço Giovanni Eurico Bucher, trocado por um grupo de 70 presos políticos, entre eles o jovem Bona, no auge da ditadura comandada pelo truculento general Garrastazu Médici, que estava na presidência do país. O longa se arrasta de forma sonolenta, mostrando as passagens pelo exílio de Bona e sua companheira Cecília (Fernanda Moro), pelas capitais Argel, Paris e Santiago do Chile, secundados pelo professor (Nelson Diniz) e sua namorada (Sílvia Buarque), o fiel escudeiro (Sirmar Antunes) e Cesar Troncoso que brilhou no filme uruguaio O Banheiro do Papa (2007), com atuação destacada e eficiente. Também no elenco Marcos Paulo como um delegado torturador e sádico.

O roteiro é bem pragmático quase simplório, parte do assalto a um carro por dois universitários ligados a VPR. Mostra a aproximação na faculdade de uma garota mimada e confusa a Bona, logo se apaixonam e voltam a se encontrar no exílio, passam por muitas dificuldades financeiras e saudades do Brasil, nascem os filhos e a vida fica ainda mais complicada para o casal. Há a incipiente passagem pela Ilha do Presídio de Bona e seus companheiros , as visitas da namorada, mas com o sequestro do embaixador suíço, que vem como tábua de salvação, Bona é banido para o Chile em 1971 com outros 69 presos políticos. Peca por muitas obviedades e singelezas, como o interrogatório artificial, embora o delegado fosse um sádico, as cenas estão longe do realismo, ficando na periférica demonstração de ausência de terror, ou se aproximando mais de uma conversa informal. Outro pecado capital está na montagem e na edição, existindo vária cenas de som posteriores as imagens passadas com diálogos soltos, como se fosse um delay.

A direção é frouxa e Leonardo Machado não chega a convencer em seu papel principal, embora não seja um mau ator, fica devendo, bem como Fernanda Moro como a companheira está sem um mínimo de dramaticidade, de fraca atuação, longe de uma pessoa sofrida no exílio. Porém o ator uruguaio Cesar Trancoso está sobrando no filme, tem carisma e não precisa de comando, pois seu talento está sempre fluindo.

Em Teu Nome está longe de ser um grande filme, embora não seja um fracasso total, decepciona pelo que se esperava dele, apesar de arrastar-se em algumas cenas, falta o clímax e o envolvimento no drama, pois não podemos esquecer que estamos no meio da maior ditadura do Brasil, sob os auspícios o General Médici, em plena década de 70. Há a explosão de outro golpe na América, desta vez no Chile, sob o comando de outro general, o Pinochet, um dos maiores sanguinários que passaram pela Terra, fuzilando pessoas inocentes ou que tinham ideias contrárias ao regime, em pleno Estádio Nacional.

Mas no filme de Nascimento a emoção está ausente, a profundidade fica distante e os fatos acontecem linearmente. Poderia se inspirar no talvez maior filme sobre a ditadura no Brasil, o extraordinário Pra Frente, Brasil (1983), de Roberto Farias, onde o futebol é usado como símbolo de anestésico de um povo embriagado pela conquista da Copa do Mundo de 1970 , no México, enquanto isso os presos políticos eram torturados barbaramente na celas ao som dos gols de Pelé, Tostão e Jairzinho. Outro filme recente que mostra bem as cicatrizes abertas da ditadura militar, embora muito contestado tem seus méritos, Lula, o Filho do Brasil (2009), de Fábio Barreto. Ainda que existisse alguma propaganda política, não pode ser excluídas as virtudes de apresentar uma nação conturbada e sugada pelo estado de exceção, onde os direitos políticos inexistiam, passando longe de uma plena democracia.

Nascimento conduz Em Teu Nome de forma rasa sem grandes voos. Os fatos se sucedem, com acontecimentos que deveriam ser priorizados, mas acabam por se banalizarem, pois não há o convencimento. Fica a ditadura militar numa esfera de planície, sem um avanço crítico contundente, mais na base de depoimentos pessoais, como se fosse algo instantâneo. Bona diz que não se arrependeu, mas as sequelas não chegam a aparecer num horizonte de contestação, sobrando uma frase forte da jovem torturada: "Tira a roupa, fique nua". E Nascimento continua devendo um bom filme.

Nenhum comentário: